1940 - 2020
Muito amorosa e vaidosa, era conhecida como "a senhorinha cheirosa".
Acordava cedinho e preparava todo dia uma boa quantidade de café e cuscuz, como quem sempre esperava receber alguém em casa. O almoço também era farto, para o caso de algum filho, neto ou bisneto chegar. O que ela mais amava era reunir todo mundo.
Em casa, entre uma tarefa e outra, passava o dia escutando hinos religiosos em um radinho velho que carregava para lá e para cá. Além do gosto pela música, fazia isso para decorá-los e “não passar vergonha” por não saber ler.
Além de cuidar de todos, suas atividades preferidas eram orar e frequentar os cultos na Assembleia de Deus, que ficava na rua de trás de sua casa. Fora isso, que fazia a pé, ela só saía pela cidade de carona. Entre muitas limitações impostas pelo analfabetismo, sair sozinha quase não era uma possibilidade, porque ficava apreensiva por não saber ler o letreiro dos ônibus. Mas nunca faltou quem a carregasse para lá e para cá, como retribuição à sua dedicação total.
Carinhosa que só, sabia abraçar como ninguém. Nailda era o amor em forma de gente. Diferente de muitos avós por aí, adorava e estava sempre pronta para tirar fotos. E ficava linda em todas, porque era muito vaidosa e, apesar de não usar maquiagem devido à religião, o cabelo branquinho estava sempre arrumado, preso em trança e coque. Ela também era muito cheirosa. Não ficava um dia sem passar perfume e cremes no corpo.
Nascida em Irecê, na década de 1940, ela e seu companheiro José se conheceram, namoraram um pouco e logo se casaram. Começaram a vida na Bahia, onde criavam gado e tiveram dois filhos. Os próximos três nasceram em Goiás, estado no qual passaram sete anos. A última mudança foi para Brasília, cidade em que se firmaram e tiveram mais um filho, 18 netos e seis bisnetos.
Enquanto o marido adorava a capital do Distrito Federal, e nunca sonhou em se mudar de novo, Nailda ficava saudosa do interior. Sempre cuidando da casa e da família, sonhava em ir viver em um local mais tranquilo e menos perigoso, para ficar mais livre e poder plantar de tudo em um terreno maior.
Construíram uma vida humilde, mas de muito amor. Foram sessenta e cinco anos juntos. Eles não gostavam de ficar separados e eram tão apegados que, há tempos, ela dizia que queria partir junto, pois não aguentaria o sofrimento de viver sem ele. Apesar de achar uma besteira o que a esposa dizia, foi exatamente isso que aconteceu.
Internados um dia após o outro e em hospitais diferentes, resistiram por sete dias ao coronavírus. A senhorinha de 79 anos, faleceu primeiro. Poucas horas depois, no mesmo dia, o marido José Anacleto da Silva — que recebeu um tributo em seu nome aqui no Inumeráveis — também se foi. Não conseguiram ficar sem o outro aqui na Terra. Agora, seguem juntos, na eternidade.
Nailda nasceu em Irecê (BA) e faleceu em Brasília (DF), aos 79 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Nailda, Ingrid Helena da Silva Souza. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Mariana Campolina Durães, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 13 de setembro de 2020.