1921 - 2020
Amante das tardes, olhava pro céu e dizia: "Hoje tá bonito pra chuva"! E não é que chovia?
Não tinha quem passasse pela Avenida Salvador, em Senhor do Bonfim, na Bahia, e não desse um "boa tarde" ao Seu Olavo. Mas era o privilégio de vê-lo sempre lá, sentado em sua cadeira de palha, que conferia às pessoas uma tarde boa.
Uma perna suspensa no apoio da cadeira e a outra esticada e apoiada no chão; posição tão certa quanto a presença daquele homem enfeitador de tardes, todo enfeitado com sua camisa de botões, calças sociais, sandálias marrons e chapéu. Ah, o chapéu! Esse não podia faltar ao baiano pronto para presente, que presenteava o povo e as tardes com a sua presença.
Seu Olavo criou os filhos trabalhando sob o sol forte e sobre a terra rachada do sertão. Lidava com a terra com muita maestria; sabia que ali estaria o alicerce da construção de seu grande legado. Mas esse mesmo homem forte e persistente, era também o que exalava calma e serenidade. Assim, com equilíbrio, é que ia, com facilidade, das reclamações às histórias de fazer chorar de tanto rir.
"Ele comia tomate com farinha na hora do almoço e depois bebia água num copo de alumínio. Cuspia no chão pra finalizar, mas quem abria a boca pra reclamar? Ele podia!", conta a neta Patrícia, que contrasta: "Ele também chorava muito de saudade de Dona Pequena, sua companheira. Seu Olavo nunca mais foi o mesmo Olavo, nem o mesmo papai, nem o mesmo dindinho depois que a pequena dele se foi. Ah, como ele pediu pra essa pequena voltar!", completa.
Ao lado de Dona Pequena, por quem era muito apaixonado, ensinou os netos a lhe chamarem de "dindinho" e lhe pedirem a bênção com a mão direita. Mãos múltiplas pegavam em sua mão e lhe apresentavam ao novo. Sempre. Foi assim que ele aprendeu a usar o telefone. Ligava para o filho na roça e perguntava: "tá chovendo aí, meu filho?"
Quando Olavo partiu, caiu uma chuvarada. Senhor do Bonfim chorava. De tanto ouvir seu amor pedir, Dona Pequena veio lhe buscar. A tarde de 28 de julho, mais triste, regava também o final feliz de uma história de amor. Olavo não podia negar o pedido de dona Pequena e foi morar com ela e com seu filho mais velho, Ostivaldo Gonçalves de Almeida, também vítima do coronavírus.
São muitas as sementes que crescem sob a luz do Sol Olavo. "Nós, familiares, choramos a dor da perda, mas estamos fortalecidos, porque sabemos que seu Olavo está agora ao lado de quem ele nunca aceitou ter saído. Cada um de nós tem um pouquinho de seu Olavo pra compartilhar por aí."
Olavo nasceu em Senhor do Bonfim (BA) e faleceu em Senhor do Bonfim (BA), aos 99 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pela neta de Olavo, Patrícia Lais de Souza Gonçalves. Este tributo foi apurado por Rogério Oliveira, editado por Irion Martins, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 17 de agosto de 2020.