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Paulo César Salamene

1969 - 2020

Brincalhão incorrigível, emprestava leveza à vida e carinho a todos.

O mais velho dos sete filhos da dona Rosalina, Paulinho sempre se esmerou nos cuidados com a mãe, que diante de tamanha cumplicidade o elevou ao posto de “filho confidente”. Para a irmã caçula, Samara, a forte relação entre os dois foi construída com tanto carinho que, não por acaso, um dos últimos feitos de Paulo foi montar um quarto hospitalar para a mãe.

“Minha mãe ficou doente da noite para o dia, em abril deste ano. Ele foi o primeiro a saber e veio me contar. Montou um quarto hospitalar para ela na minha casa, contratou uma cuidadora e ficou doente na semana seguinte”, recorda Samara. Enfermeiro de formação e professor de Biologia, Paulo preparou o espaço de forma minuciosa para acomodar bem dona Rosalina, acamada em decorrência de uma parada cardíaca.

Dono de um sorriso largo e fácil, costumava compartilhar vídeos engraçados e piadas pelo celular. Não dispensava o humor sequer para preservar a memória de integrantes da família e suas manias. “Tínhamos uma tia por parte de pai, que nunca casou ou teve filhos, e se ocupava com os sobrinhos. Dona Olinda, a tia Linda, uma figura. Toda vez que um de nós fazíamos aniversário ela, já velhinha, ligava cedinho e cantava ‘parabéns pra você’ no telefone. Depois que ela faleceu, meu irmão Paulinho continuava esse ritual. Ligava pra gente e imitava a voz dela no telefone igualzinho, era hilário”, revela Samara.

Paulo completou 50 anos em 2019, mesmo ano em que, no México, nasceu sua primeira neta. Pai de dois filhos e responsável por três cachorrinhas, também tidas como filhas, fazia amigos com facilidade. Entre seus maiores prazeres estava reunir pessoas para um churrasco. O ex-aluno e enfermeiro Renato, amigo de longa data, fez questão de procurar a família de Paulo para agradecer por pessoa tão especial e para reforçar o quanto ele foi importante em tantas vidas. Em áudio enviado a Samara, Renato diz que Paulo “passou por esta terra emprestado por Deus, pois tinha a missão de salvar vidas. Estava sempre apto a ouvir e orientar da melhor maneira possível a todos. Quando achei que não tinha mais saída, ele veio e me ajudou”, garantiu.

Paulo era grande fã de rock. “Colecionava vinil, DVDs de séries, filmes e CDs e a sua banda favorita era Iron Maiden”, conta Samara. Apesar de gostar do barulho do gênero, adorava pescar e passar um tempo quieto no mato. Pensava em curtir o restante da vida assim, embora fosse um plano distante, já que mantinha uma jornada de trabalho extensa, em dois turnos. Estava reformando a casa em Caraguatatuba que, segundo Samara, “era uma espelunca e estava virando um casarão”, mas não teve tempo de terminar, nem de conhecer pessoalmente a sua netinha.

Paulo nasceu Caraguatatuba (SP) e faleceu Caraguatatuba (SP), aos 50 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela irmã e pela filha de Paulo, Samara Salamene e Thais de Souza Salamene. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Magaléa Mazziotti, revisado por Daniel Schulze e moderado por Rayane Urani em 11 de agosto de 2020.