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Paulo Fabiano Laurindo

1976 - 2021

Amava enviar selfies pros amigos e familiares, de qualquer lugar onde estivesse, para mostrar seu dia a dia.

Na família era chamado carinhosamente de Fá e na rua logo virou o Alemão, por ser bem loiro e de olhos azuis. Nunca foi de ficar quieto. Tinha pressa. Talvez soubesse que seu tempo neste mundo era curto.

Desde criança sempre foi muito agitado. Vivia com o dedão do pé todo estropiado. Não era a pessoa mais indicada para dar notícias delicadas. Dizia logo, sem meias palavras, tudo que tinha pra ser dito.

Foi um filho amoroso e cuidadoso. Ligava todos os dias para os pais e, nas suas folgas, fazia questão de visitá-los no sítio e saber se estavam bem ou precisando de alguma coisa. Suas visitas eram sempre uma festa. Mesa farta com o seu pudim favorito e salada de maionese. Muitas histórias e risadas. Às vezes, fazia pra gente o seu famoso “feijão gordo”.

Sempre ajudou os pais. Na infância, quando moravam no sítio, cuidava dos irmãos. Ainda menino trabalhou na máquina de beneficiar arroz e na granja da família. Depois, na poda de árvores e na estruturação do Sítio São Francisco. Quando virou adulto e seguiu seu caminho, ainda continuou ajudando. Foi o maior incentivador para o plantio das pitaias e, em 2019, fez uma plantação de caju e abacate, cujos frutos começaram a ser colhidos em 2022.

Era o mais velho de quatro irmãos. Nasceu com a responsabilidade de cuidar, proteger e guiar, e levou essa missão bem a sério. Cuidou até com um certo exagero dos irmãos na adolescência. Foi difícil para as irmãs conseguirem namorar. Era o jeito dele de demonstrar amor.

Apesar de ser o irmão mais velho, foi o último a ter um filho. Enquanto isso, curtiu muito os sobrinhos. Mimou e ajudou a cuidar de todos, mesmo de longe. Sempre ligava pra saber como estavam e, se necessário, já passava um corretivo. E quando estava junto não media esforços para garantir a diversão. Ajudou na construção de uma tirolesa, fazia balanços e fogueiras.

Foi um momento lindo quando se tornou pai. Talvez a única ocasião em que desacelerou um pouco. O moço bruto e agitado, tornou-se gentil e tranquilo. Fazia de tudo por essa filha. Era a Pipinha. O amor transbordava de seus olhos ao falar dela. Amava viajar com a filha e a esposa.

Quem olhava de fora às vezes podia confundir essa agitação com grosseria, mas quem o conhecia sabia o quanto era amoroso e gentil. Sempre ajudava a todos ao seu redor. Conhecidos ou desconhecidos. Fosse com dinheiro, cesta básica ou com o que havia de melhor: seu tempo. Era parceiro para um copo de cerveja, um desabafo e até para carregar uma mudança num domingo. Estava sempre pronto.

Como trabalhava fora, tinha apenas um final de semana por mês em José Bonifácio para visitar a família e os amigos. E ele valorizava e multiplicava cada segundo desse final de semana. Levava a filha pra andar de skate, consertava a casa, coletava sementes para a esposa, fazia churrasco com os amigos, visitava os pais no sítio, encontrava amigos e familiares, degustava a cerveja artesanal do primo — que fazia uma IPA no capricho pra ele, sua favorita.

Aprendeu com sua avó paterna e seu pai a amar o Santos Futebol Clube. E como amou! Não perdia um jogo pela TV e sempre que possível ia ver pessoalmente com os amigos. Estava sempre com a camiseta do Santos. Só tirava pra colocar o uniforme do trabalho ou alguma roupa social em ocasiões muito especiais. Não bastava somente ele usar as camisetas, dava de presente pra todos da família.

As festas de fim de ano e as pescarias da "Laurindolândia" nunca mais serão as mesmas sem sua alegria barulhenta. Sem as abelhas picadas na sua língua no fim da noite. Sem as trapalhadas, porque nisso ele era especialista.

Sua partida repentina nos fez acreditar na eternidade — não que a gente não acreditasse antes, mas agora nos parece algo mais real. A gente até imagina um lugar com campo de futebol e churrasqueira. Com roda de amigos e a vida passando sem pressa.

E é assim que a gente gosta de imaginar que você está: fazendo festa aí no céu! Fica em nossa lembrança o som da sua risada, seu abraço apertado, o cheirinho do seu café com canela e todo esse amor que você espalhou.

Até qualquer dia, Fá.

Paulo nasceu em José Bonifácio (SP) e faleceu em José Bonifácio (SP), aos 45 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela irmã de Paulo, Verônica Laurindo. Este tributo foi apurado por Rayane Urani, editado por Verônica Laurindo, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 23 de maio de 2022.