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Raimundo Coelho da Silva

1948 - 2020

Tinha cheiro de café, abraço apertado e bondade infinita.

O mundo era melhor com Raimundo. Quem o conheceu entende. Impossível não se encantar com seu jeito sereno e leve de levar a vida.

Sua vida não foi fácil. Com apenas 9 anos carregou sacos de castanha nas costas, baldes de látex na mão. Não estudou quase nada, mas possuía uma sabedoria que só coração e mente bondosos são capazes de ter.

Durante anos, viajou pelos rios da região como forma de trabalho. Operou máquinas pesadas nas minas de caulim. Era pouco mais de 1,5m de pessoa dentro de uma grande máquina.

Saia de casa na sua bicicleta antes do dia clarear e chegava no começo da noite. Assoviava de longe. Fazia os netos esperarem por sua chegada. Trazia carinho e lanches.

Sempre dorminhoco, dormia em frente a TV, nas missas, onde se encostasse. Mas nunca deixou de dar atenção, de ouvir e aconselhar. Mesmo ouvindo pouco, era sempre atento aos que precisavam falar.

Inventou sua própria terapia, cuidar por horas a fio da sua “fubíca”, sua caminhonete antiga. E não se sabe se têm peças que a consertem. Mas aqui ganhou um perfume seu: graxa, café e sabonete Phebo. Tudo na medida certa para deixar ainda mais gostoso seu abraço.

Ele era aquela pessoa que onde houver alguém que o tenha conhecido torceu para que vencesse essa batalha, porque todos sabem que o mundo era melhor com ele.

Este texto foi escrito quando ele ainda lutava pela vida e trocar o tempo verbal de muitas frases doeu, assim como essa perda doerá para sempre em nossos corações.

"Ele era, sem nenhum medo de ser injusta com os meus, a pessoa mais importante da minha vida. Com e por amor a Raimundo, meu pai." Declara Giulia, a neta-filha.

Raimundo nasceu Pará (PA) e faleceu Laranjal do Jari (AP), aos 72 anos, vítima do novo coronavírus.

História revisada por Noêmia Maués, a partir do testemunho enviado por neta Giulia Gabrielle da Silva Braga, em 22 de maio de 2020.