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Regina Cunha Coutinho

1942 - 2021

Mãe amorosa, certa vez definiu-se para os filhos como “um cobertor quentinho num dia frio!”

O começo da vida de Regina foi bastante simples. Ela vivia no campo e desde muito cedo trabalhava para ajudar o seu pai. Contava ter sido muito apegada à mãe, que era costureira. O trabalho as aproximava: quando a mãe passava a noite costurando, a filha permanecia ao seu lado, segurando a lamparina para ela enxergar a costura pelo tempo que fosse preciso.

Depois de alguns anos, o pai a levou para outra cidade, para morar e trabalhar em uma casa de família, e também estudar. Regina chorava todas as noites com saudade de casa e do irmão mais novo que naquela época era bem pequeno. Então, ela acabou escrevendo uma carta para o pai e conseguiu que ele fosse buscá-la. Quando ele chegou, ela ficou em êxtase!

Na tentativa de que ela desistisse de ir embora, a dona da casa lhe ofereceu diversos objetos, procurando convencê-la a ficar. Entretanto, como ela morava e trabalhava naquela casa a troco de uma estadia para realizar os seus estudos, estava decidida a ir embora para o seu lar. Nas palavras dela, teve "a melhor sensação da vida" ao retornar para casa e dormir em sua esteira no chão.

Logo depois, Regina começou a dar aulas para crianças e juntou dinheiro para comprar um cavalo, que usava como meio de locomoção para ir à escola. Lecionou até o seu casamento, quando decidiu dedicar-se à família que começava a construir.

Regina conheceu o futuro marido na igreja que frequentava. Um dia, após o culto, os dois voltaram para casa pela estrada, conversando, sob o olhar dos pais dela, que vinham logo atrás. Começaram a namorar, casaram-se e permaneceram juntos por cinquenta e nove anos e dez meses.

Ele sempre foi muito correto e ela foi uma esposa paciente, amorosa, muito companheira e sempre pronta a auxiliar o seu amado. Durante o casamento, apoiou incondicionalmente o marido e tinha sempre uma palavra de sabedoria para guiá-lo.

A neta Yndyanara conta sobre a avó: “Ela foi minha melhor amiga. A pessoa mais doce que já conheci na vida! Vaidosa, gostava de exibir as netas, já que somos apenas duas, o restante dos netos são meninos. Frequentemente conversava conosco por aplicativo de mensagens. Não tinha um dia sequer que ela não me desse um 'bom dia!' Aos domingos, pedia para que uma das netas fizesse suas unhas. Dava para ver a satisfação no olhar quando fazíamos isso por ela. Dotada de um humor ímpar, sempre falava uns ditados que só ela conhecia”.

E a neta continua: "Ela era doce, muito calma. Tinha a habilidade de ser calmaria em meio a tempestades — só a voz dela já tranquilizava. Ela se dispunha a ouvir com paciência, respeitava cada um como era, amava as pessoas. As irmãs do meu avô diziam que ela era a melhor cunhada de todas. O meu pai, mesmo separado da minha mãe, sempre diz que ela foi a melhor sogra que ele teve!”

Ela amava se reunir com filhos e seus netos. Nos almoços de domingo, depois da refeição, gostavam de ficar todos deitados na sala conversando e rindo. Yndyanara conta também que, quando pequena, todas as noites antes de irem para a cama, ela sempre cantava um hino da igreja chamado "Nome Precioso (Nome bom, doce à fé)", interpretado pela banda Universos, e esse costume estendeu-se até sua vida adulta.

Regina gostava de ver programas de TV, de cantar, louvar a Deus e receber pessoas queridas em sua casa. Fora isso, tinha suas atribuições na Igreja onde era membro do coral.

Saudosa, A neta relembra de histórias inesquecíveis de sua infância: “Meus avós tinham um sítio e no tempo em que eu era criança, a via de acesso era muito ruim — uma estrada de barro, sem iluminação. Certo dia, estávamos indo até lá e o ônibus quebrou na estrada. Foi anoitecendo e nada do veículo voltar a funcionar.

Naquela época, nem sinal de telefone havia por aquelas bandas. Então, ela olhou para mim e disse: 'Minha filha, vamos fazer um passeio até a casa do vovô? Vai ser tranquilo, dá uns dez quilômetros até lá'. Eu, com 8 anos, perguntei: 'Vó, o que são dez quilômetros?' Ela, então, me respondeu: 'Você saberá quando andar por eles. Garanto que não se esquecerá'!"

Depois da longa caminhada, chegamos — sujas de barro e mortas de cansaço! Então, disse a ela que não tinha gostado de conhecer os dez quilômetros... Para deixar a situação ainda mais cômica, quando chegamos no sítio, não tinha eletricidade e nos banhamos à luz de velas, com um balde de água do córrego, supergelada. Por fim, quando nos deitamos na cama, com a janela aberta, o céu estava tão estrelado que ela começou a contar uma história bíblica, que Abraão ter tido tantos filhos quanto o número de estrelas. Passei semanas me perguntando como ele conseguia dar brinquedo para tantos filhos”.

Relembra que a presença da avó foi marcante também em sua adolescência: “Lembro de quando me apaixonei pela primeira vez, adolescente ainda. Eu estava vendo umas fotos no computador e, em uma delas, apareceu o moço que eu estava gostando. Ela, que estava ao meu lado, então apontou para ele e disse: 'Hummmm... é por esse aqui que você está carregando uma carroça?' Ela sempre foi minha direção, me conhecia apenas pelo olhar".

Regina queria que todos os seus filhos e netos gozassem da mais plena felicidade. Deixou para eles, como maior ensinamento, que a vida deve ser levada com leveza e simplicidade, mas também com firmeza para suportar as escolhas necessárias.

A filha e o marido de Regina também foram vítimas da Covid-19. Para conhecer um pouco da história deles acesse as homenagens a Eudes Cecília Coutinho e Oswaldino Luiz Coutinho neste Memorial.

Regina nasceu em Itaperuna (RJ) e faleceu em Jaru (RO), aos 78 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela neta de Regina, Yndyanara Camargo. Este tributo foi apurado por Andressa Vieira, editado por Vera Dias, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Ana Macarini em 7 de maio de 2023.