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Reinalda Conceição

1948 - 2020

Uma mulher de alma pura, que amava bonecas, a Branca de Neve e os sete anões.

Dignidade, esta é a palavra que define toda a trajetória de Dona Reinalda, uma mulher incomparável que junto com seu esposo, Senhor José Carlos Pereira, criou sete filhos. Foi merendeira, cozinheira e lavava roupa de ganho.

Até antes de partir, fazia questão de passar e engomar as roupas dos filhos. “Ninguém passava roupa como ela, com tanto capricho, a roupa ficava tinindo!”, lembra com saudades a nora Marluce. E Dona Reinalda tinha muito orgulho de ser uma excelente passadeira, assim como era grata por tudo que possuía. Com o pouco que tinha, era muito feliz.

Dona Reinalda foi hospitalizada por conta de um pico de hipertensão e acabou contraindo a covid no hospital. Quando foi internada, os filhos fizeram questão de cuidar da mãe, antes de ela ser transferida para a UTI. A caçula, Amanda, viajou de São Paulo para a Bahia para ficar junto da mãe e cuidar dela, Renata também ofereceu à Dona Reinalda todos os cuidados, nenhuma das duas se infectou. Apenas o filho mais velho, Arnaldo, por ficar ao lado da mãe e dar até banho, infectou-se. Foi internado, esteve na UTI, mas venceu a doença. Marluce fala, com o coração apertado, que acredita que o amor dos filhos foi tão poderoso que os poupou.

Dona Reinalda não teve infância, desde muito cedo começou na lida. Deve ser por isso que conservou em seu íntimo uma alma pura de criança. Ficava feliz e agradecida com pouca coisa. Era apaixonada por bonecas e miniaturas. A família ia ao McDonald's e pedia o lanche infantil, mesmo sem querer comer, só para dar as pequenas surpresas para Dona Reinalda. Suas maiores paixões eram a Branca de Neve e os Sete Anões.

Marluce estava atrás dos personagens para dar à sogra; esses que vêm em forma de pequenas estátuas de jardim, para Dona Reinalda enfeitar a varanda de sua casinha, reformada há menos de um ano, mas não deu tempo. A casinha, que antes era um barraco de madeira, foi construída do jeitinho que Dona Reinalda sonhou, até com a varandinha.

A quinta bisneta nasceu poucos dias depois de sua partida. Chama-se Liz. A bisavó dizia, cheia de contentamento “Essa nenê vai ficar bem aconchegadinha aqui no meu peito gordinho”. Também não deu tempo, infelizmente.

Não sabia ler. Mas fazia questão de ir à igreja e pegar o folheto; ficava fingindo que lia e acompanhava a cerimônia, para disfarçar dizia: “Eu esqueci meus óculos em casa, filha!”

Apesar de não ter instrução formal, essa mulher encantadora era um poço de sabedoria, sua beleza resplandecia no olhar e sua grandeza, transparecia num coração generoso.

A saudade é imensa e aperta o peito. O consolo de todos são lembranças, todas elas felizes, proporcionadas por essa mulher extraordinária e que amava a Branca de Neve.

Reinalda nasceu em Itabuna (BA) e faleceu em Itabuna (BA), aos 72 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela nora de Reinalda, Marluce Domingos dos Santos Braitt. Este tributo foi apurado por Ana Macarini, editado por Ana Macarini, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 2 de agosto de 2020.