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Rosana Aparecida Feler Melo

1972 - 2021

Queria viver até os 100 anos e parece tê-los vivido dentro dos 48 aproveitando intensamente cada momento.

Rosana era muito intensa, única, e sempre dizia que a vida era uma só, reforçando ser preciso aproveitar cada momento porque o tempo passava rápido.

Era filha de Avelino e Barberina, que possuíam características especiais: ele, apesar de não ser muito carinhoso, demonstrava de outras formas o quanto a amava e ela, um pouco mandona, mas sempre fazendo questão de dizer que amava a filha. Rosana fazia o possível para estar presente com eles em todos os momentos e, além de ter decidido morar ao lado da casa deles, dava um jeito de toda sexta-feira almoçar polenta com os pais.

Ela foi casada com Taciano José por 26 anos, que conheceu na Oktoberfest, uma festa típica de Blumenau e, a partir daí, descobriram que suas famílias moravam próximas. Os dois nutriam um sentimento muito profundo e, desde o início da relação, incentivaram um ao outro a crescer profissionalmente. Viajavam bastante por lugares diferentes e demonstravam amor cozinhando um para o outro, sempre enfrentando as dificuldades do relacionamento com muita sabedoria e compreensão pela certeza de que o sentimento era maior que qualquer outra coisa. Esse entendimento foi a base para ficarem juntos até o fim.

Tiveram os filhos Bruno e Gabriela. Como mãe, Rosana prezava pelo trabalho e a autossuficiência dos filhos, um aprendizado que, após sua partida, apesar de toda a tristeza, deixou-os preparados para seguir a vida sem ela, como conta Bruno: “Foi uma mãe maravilhosa! Adorava nos presentear, desde roupas até algum doce que gostávamos. Gostava de ir à praia e fazer a farra, tornando nossos momentos ao seu lado, inesquecíveis. Inclusive, se pensarmos em praia, logo lembramos de nossa mãe. Não era muito carinhosa fisicamente, como dar abraços e beijos, mas demonstrava o carinho que tinha por nós de outras formas, como preparar o lanche que levávamos para o trabalho e escrever no guardanapo que nos amava”.

Rosana fazia questão que em todas as datas comemorativas seus pais estivessem presentes e eles, frequentemente, relembram o quanto ela era trabalhadora, guerreira, feliz, muito sociável e apaixonada pela vida.

A família praticava alguns hábitos como ir para a praia de manhã, tomar sol o tempo todo e voltar apenas no fim da tarde; preparar jantares especiais regados a um bom vinho; viajar mês de julho, e se hospedar em um hotel, normalmente sempre no mesmo lugar, onde Bruno e Gabi cresceram e que se tornou lugar super importante para eles!
Apreciava convidar a todos para ficar em sua casa à beira-mar e, uma vez lá, logo cedo, acordava os seus convidados para com ela fazerem uma verdadeira farra.

Rosana era uma mulher extremamente forte, que não gostava de demonstrar os seus sentimentos para qualquer um, preferindo ser vista como alguém inabalável. Trabalhadora, amava a sua profissão e a possibilidade de socializar com todas as suas clientes. Extrovertida, falava com as pessoas em qualquer lugar sem nem ao menos conhecê-las.

Dona de um salão de beleza, atuou como cabeleireira durante 27 anos no mesmo bairro onde morava e convivia com as pessoas, mas se fosse preciso, fazia de tudo um pouco. Levava o seu trabalho extremamente a sério: por mais que fosse autônoma e pudesse fazer seus próprios horários, sempre seguiu sua rotina pontualmente, nunca faltando ou deixando de trabalhar sem algum motivo plausível. Excelente no que fazia, era extremamente persuasiva, conseguindo vender quaisquer coisas. Além disso, atendia a todos igualmente, com muita atenção e carinho.

Líder nata, em todos os grupos que participava tomava a frente para organizar e fazer as coisas acontecerem e um de seus últimos sonhos realizados foi entrar para o grupo de casais Lareira, onde ela amava ajudar em projetos sociais para apoiar necessitados e, por uma boa causa, vendia rifas como ninguém.

Amava viver, e sempre aproveitou cada segundo do seu dia. Nunca deixava nada para o dia seguinte. Por ela, teria vivido o máximo possível, inclusive, sempre falava isso para todos, que viveria até os cem anos e que as pessoas teriam que aguentá-la até lá.

Tinha cabelos vermelhos, um sorriso contínuo em seu rosto, passava batons com cores marcantes na boca e se vestia com roupas bem chamativas. Tinha uma presença marcante e gostava muito disso. Inesquecível, sempre fazia todos ao seu redor rirem e se divertirem! Ao seu lado nunca existia tempo ruim, todo momento se tornava a mais pura diversão.

Sentia satisfação em cozinhar para meio mundo de gente, sempre liderando a cozinha, fazendo inúmeros panelões de macarrão, feijoada e yakissoba. De tempo em tempo, viciava-se em alguma nova especiaria e a utilizava em todas as suas comidas, como quando descobriu o alho-poró e passou a fazer uso dele em todos os pratos que preparava até se cansar dele.

Nas horas vagas gostava de assistir às séries do momento, enquanto fazia crochê e, quando começava alguma, não parava até acabá-la e, durante a pandemia, quase zerou o catálogo de um serviço de streaming. Gostava também de jogar canastra em família e, às vezes, fazia algo diferente para a família comer.

Bruno guarda na memória boas lembranças vividas com Rosana: “Nossa mãe não gostava muito de tirar fotos e, por coincidência ou não, na última vez que fomos à praia, ficamos até o sol se pôr. Então, ela pediu para a Gabi tirar fotos dela com o Sol. Toda vez que vemos as fotografias desse dia, chegamos a nos emocionar porque nas imagens, ela está caminhando em direção ao pôr do sol. Creio que será sempre a lembrança mais marcante dela. Significa muito para nós!”

E continua: “Ela me acordava todos os dias para ir ao trabalho, de uma maneira bem brusca, quase quebrando a porta do meu quarto. É certamente o costume que mais sinto falta! Diversas comidas nos trazem lembranças dela, como polenta frita, camarão, capeletti, rolinho primavera. Ela não gostava de feijão, mas fazia a melhor feijoada desse mundo. Tinha o hábito de comer pão com linguiça e deixar tudo na mesa para os filhos guardarem”.

Rosana era apaixonada pelos pais e pelos filhos e, segundo Bruno, não tinha nenhum sonho marcante, queria apenas vê-los conquistando todos os seus objetivos, se formando, se casando, ser avó e fez o melhor que pôde para isso acontecer.

Desejava também viver muito, pois queria desfrutar da vida e tudo que ela tinha a oferecer: os dias ensolarados na praia, as risadas com a família e os amigos, as inúmeras conversas com as clientes enquanto as atendia.

Sua música favorita era Sinônimos, interpretada por Zé Ramalho. Todas as vezes que os filhos escutam essa canção, sentem de alguma forma a presença da mãe, bem como sempre relembram de que os ensinamentos mais importantes que ela deixou com o próprio exemplo foi o de que vivessem o hoje intensamente, pois nunca se sabe como será o amanhã; não se importar com o que os outros pensam porque no fim das contas, todos irão para o mesmo lugar.

E Bruno conclui saudoso: “Além disso, nos formou como pessoas, já que nos ensinou a lidar com praticamente tudo da vida. Sempre que ela nos ensinava algo, soltava a frase: “aprende comigo enquanto eu tô viva”. Na época, ríamos e não dávamos muita importância, mas agora, toda vez que vamos fazer algo que ela nos ensinou, a frase vem à cabeça.

Outra recordação é de quando ela queria fazer algo diferente e lhe diziam que os outros a julgariam e, ela sempre dizia: “'não são eles que pagam minhas contas!'. De fato, é uma frase ótima para nós nunca deixarmos de fazer algo por medo do julgamento alheio”.

Rosana nasceu em Blumenau (SC) e faleceu em Blumenau (SC), aos 48 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelos filhos de Rosana, Bruno Melo e Gabriela Melo. Este tributo foi apurado por Andressa Vieira, editado por Vera Dias, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Larissa Reis em 22 de setembro de 2022.