1963 - 2021
Acordava cedinho e, com otimismo e fé, agradecia cada dia, cada amanhecer.
“Ouve o canto gauchesco e brasileiro
Desta terra que eu amei desde guri
Flor de tuna, camoatim de mel campeiro
Pedra moura das quebradas do Inhanduy” - (Canto Alegretense, de Nico Fagundes e Bagre Fagundes)
Assim começavam os dias de Saturnino: agradecendo a vida, e ouvindo seus cantores gaúchos; dentre eles, os preferidos eram Baitaca, Crioulo dos Pampas e Gildo de Freitas.
Saturnino foi casado com Marilena Librelotto, que era viúva e mãe de Lucélia. No início do relacionamento entre os dois, Lucélia confessa que “morria de ciúmes” de Saturnino, mas depois “ele conquistou a todos”. Conquistou de tal maneira que, após a morte de Marilena em 2017, Saturnino foi morar com Lucélia, seu marido Fernando e seu filho Miguel, neto amado e mimado por Saturnino.
Saturnino era hipertenso, diabético e tinha glaucoma, por isso demandava cuidados. Entretanto, comportava-se como se fosse ele o cuidador. Enlutada devido a morte da mãe, era ele quem consolava Lucélia, mesmo sofrendo a perda da esposa. Quando Lucélia apresentava sintomas de ansiedade e pânico, era ele quem passava a noite em claro cuidando e dando conselhos à filha. “Saturnino era sempre muito prestativo e amável com todos ao seu redor”, ela afirma.
Ele não tinha filhos biológicos, mas, segundo Lucélia, tratava os cinco filhos de criação como se fosse o verdadeiro pai. Ela lembra que, quando algum filho estava com problemas financeiros, ele dava o que tinha no bolso, mesmo que ficasse sem nada. “Homem de coração puro, ele sempre pensava no outro antes de pensar nele mesmo”.
Lucélia conta que, ao longo da vida, Saturnino sempre se preocupou e cuidou das pessoas. Quando tinha 26 anos, sua mãe morreu. Como ele era o mais velho da família, sentia-se responsável pelos irmãos. Guerreiro, trabalhou para manter os irmãos menores e ainda ajudava na criação dos sobrinhos.
A vida inteira, Saturnino foi trabalhador rural, mas por conta dos problemas de saúde, estava aposentado. Mesmo assim, não conseguia recusar um pedido de ajuda. “Quando alguém precisava, mesmo com dor, ele ia e voltava feliz”, declara a filha.
As manhãs não são as mesmas sem Saturnino. A vida perdeu em sorriso e bondade; o céu ganhou em alegria e versos.
“Quando eu ir para o céu
Que findar a minha história
Vou cantar versos pra os anjos
Pra todo reino da glória
Tirem a lonca da reza
Façam um grande sóvel
Que eu possa subir por ele
Até na porta do céu
Porque Deus há de ouvir
A reza que o povo fez
E eu de lá hei de cantar
Versos lindos pra vocês.” - (Pedidos de um Gaúcho, de Gildo de Freitas)
E com a lembrança dos lindos versos de generosidade, semeados e cultivados por Saturnino, Lucélia encerra sua homenagem: “Meu segundo pai, fica com Deus, cuida da mãe e diz para o meu primeiro pai não ficar com ciúmes... Até breve!”
Saturnino nasceu em Uruguaiana (RS) e faleceu em Uruguaiana (RS), aos 57 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pela enteada de Saturnino, Lucélia Pelizzaro. Este tributo foi apurado por Rayane Urani, editado por Denise Stefanoni, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Ana Macarini em 2 de dezembro de 2021.