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Sebastiana Ferraz Corrêa

1935 - 2020

Baixinha na estatura, mas gigante de alma e de coração.

Dona Sebastiana tinha um metro e trinta e cinco centímetros e gostava muito de comer. Se alguém ousasse controlar a sua alimentação, ela logo fazia uso do jargão que ficava guardado na ponta da língua para cada vez que alguém a aborrecesse: “sai daí sua rabuda!” disparava. Certa vez, ao subir na balança e constatar que estava pesando oitenta quilos, a dona de um humor sutil e marcante ponderou: “como posso estar tão gorda se eu quase não como nada?”

Claudia, neta, conta que a avó sempre foi assim. “Em Minas Gerais, quando ela tinha uns nove anos de idade, ia por uma estrada junto a uma amiguinha e avistaram um alambique. Elas pararam nesse alambique e começaram a beber. Beberam tanto quer desmaiaram! As famílias procuraram por elas o dia todo, até que finalmente as encontraram deitadas na estrada.”

De casamento muito precoce, aos doze anos de idade, a mineira teve o primeiro de seus quinze filhos aos treze. Todos nascidos em casa, com exceção da mais nova; esta última veio ao mundo um dia antes do sobrinho, irmão de Claudia. Ela relembra o episódio especial da vida da família: “Minha avó pariu no dia oito de maio e minha mãe no dia nove. Ficaram as duas internadas juntas e minha avó, toda orgulhosa, passeava pelo hospital com os dois bebês no colo. Ela falava pra todo mundo: essa aqui é minha filha... e esse aqui é meu neto!”

A mãe de dez mulheres e cinco homens lutou muito pelo bem-estar da família. Lavadora de roupas, ela pegava água no poço para realizar a atividade que ajudava o marido, feirante, a garantir o sustento dos filhos. Missão cumprida com muita fé. Aliás, fé era a marca mais forte de Sebastiana. Frequentava sempre a igreja Maranata, no bairro do Zumbi, Ilha do Governador (RJ). “Ia a semana quase toda”, relata a neta. “Na saída, quando eles se despediam, falavam: até domingo que vem irmã Sebastiana! E ela sempre respondia: se a gente não se encontrar domingo que vem, a gente se encontra na glória!” completa Claudia, que sempre via a avó orando com a família e dizendo para as pessoas se “consertarem para a volta de Jesus. Mulher valorosa! Lutou muito. Encerrou a carreira e guardou a Fé.”

Sebastiana nasceu em Minas Gerais e faleceu no Rio de Janeiro, aos 84 anos, vítima do novo coronavírus.

História revisada por Irion Martins, a partir do testemunho enviado por neta Claudia Fernandes Correia, em 21 de julho de 2020.