1927 - 2021
Irreverente, escondia por trás de um semblante sério uma jovem senhorinha que gostava de aprontar para rir de si mesma.
Filha de uma costureira que criou sozinha os oito filhos na capital gaúcha, Tereza, como era chamada por todos, descobriu tardiamente seu nome de registro. Os mais íntimos a apelidavam carinhosamente de Tetê. Orgulhosa da sua terra natal, Santo Ângelo, Rio Grande do Sul, teve que se ajeitar desde cedo junto com os irmãos para ajudar nas despesas da casa.
Não foi tão longe nos estudos, mas conseguiu o diploma no Curso Técnico de Contabilidade, o que deu base para passar nos Concursos do Estado do Rio Grande do Sul, onde acabou fazendo carreira de Auditora, ocupação que exerceu até a sua aposentadoria. Ali ainda conheceu o marido, Henio, com quem teve: Maria Virgínia e Maria Luiza. Com o tempo, a família foi ainda mais abençoada com a chegada de três netos e quatro bisnetos, o que fazia da vida de Tetê o seu objetivo maior.
“Ela não tinha luxo, era muito prestativa com todos, especialmente nas questões de saúde”, conta a neta Luciana, que viveu e acompanhou a rotina da avó por mais de 30 anos, inclusive nas idas à feira livre. Mesmo o gênio difícil e a cara sisuda dela não espantavam seu lado descontraído. “Minha avó sempre falou palavrões de forma descontraída. Gostava de piadas e tinha um hábito horrível de soltar gases e fingir que não era com ela”, brinca. A sua gargalhada em sequência confessava a estripulia. E a neta abre o jogo: “Com a idade, minha avó perdeu a vergonha de vez”.
Católica, era devota de Santo Antônio e todo mês buscava o “pão bento” distribuído na missa. Também gostava de se encontrar com as irmãs, que nutriram a união até a velhice.
Tetê manteve a autonomia e a independência até bem perto dos seus 85 anos, quando vieram os primeiros sinais do Alzheimer. Fazia as compras no supermercado, saía em passeios vespertinos para um chá nas confeitarias do bairro e cuidava das próprias finanças no banco. “Entretanto, ela não gostava de ninguém por perto quando fosse digitar a senha do cartão”, rememora Luciana com diversão. Lia romances assim como os jornais impressos para seguir as notícias, os fatos do cotidiano e da política.
A doença, no entanto, deu lugar às histórias antigas e às músicas que ela cantarolava o dia todo. “Nunca vi minha avó escutando rádio ao longo da vida, contudo percebi que ela relembrava canções da sua juventude. Tornou-se uma pessoa musical. De todo o amor que tenho, metade foi tu quem me deu!"
Therezinha nasceu em Santo Ângelo (RS) e faleceu em Porto Alegre (RS), aos 93 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Therezinha, Luciana Buchmann. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Fabiana Colturato Aidar, revisado por Magaly Alves da Silva Martins e moderado por Ana Macarini em 30 de maio de 2022.