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Valdelice Vasconcelos Nunes

1950 - 2020

Uma mulher que não cabe em palavras e que sempre será lembrada pelo seu amor, singularidade e sabedoria.

Dona Valdelice era uma pessoa cheia de vida. Um ser humano único, adorável e contagiante. Dona de um grande coração sempre disposto a ajudar o próximo. E, caso não pudesse amparar sozinha, logo dava um jeito de arrumar alguém para unir forças.

Uma senhora muito bonita, vaidosa e que adorava se arrumar. Sempre com o cabelo feito, roupas bem passadas, perfumada e com suas sobrancelhas impecáveis ─ jamais abria mão de se cuidar.

Inclusive, estar cheirosa era indispensável. “Perfumes eram sua paixão. Chegava a esconder os preferidos para que não usássemos sem ela saber. Mas bastava a gente pedir, que ela não conseguia recusar. Pedir era o segredo”, conta a filha Diana.

Foi professora da rede pública e era totalmente dedicada à educação. Desse amor e compromisso nasceu uma “escolinha” que sonhava montar há anos. Tinha, enfim, “o seu próprio lugar para ensinar”. Chegou a dar aulas para uma das filhas e, até hoje, muitos ex-alunos relembram com carinho da escola e sempre a cumprimentavam na rua quando a viam.

“Mãe amorosa de Belisa, Silvia, Diana, Jairo e de tantos outros que pela vida ela acolhia. Tia Val, como era conhecida, gostava de juntar todo mundo para o Natal e para as festividades de Ano-Novo. ‘Aproveita!’, essa era a frase que ela sempre falava”, relembra o sobrinho Leandro.

A filha complementa sobre a mãezona que teve: “Fomos muito bem-criados e educados, sem falsa modéstia. Foi a melhor mãe que poderíamos ter. Ela costumava contar que quando éramos bebês, muitas vezes, passava a noite em claro vigiando nosso sono para que nenhum mosquito nos picasse”.

Tia Val amava passear ─ fosse uma viagem ou apenas uma visita a algum amigo ─ a beleza do encontro e do reencontro com as pessoas já bastava. Ela também adorava comer. Tanto que a mensagem para os filhos com um “traz uma coisa gostosa para eu comer!” era diária. E eles prontamente obedeciam.

Na igreja depositava toda sua devoção. Dedicada que era, ia à missa todos os domingos, sempre sendo uma das primeiras a chegar. “Para pegar o melhor lugar!”, dizia ela.

“Acredito que o que ela mais amava mesmo era reunir a família. Ela se cansava, dizia que ficava dolorida de tanto ‘preparar coisas’, mas não podíamos nem pensar em fazer isso em outro lugar. Tinha que ser sempre ‘na nossa casa’. E, para completar as paixões, era alucinada pelos netos. Eles podiam tudo!”, compartilha Diana.

Dona Val também era uma colecionadora de histórias engraçadas, como as que protagonizava quando usava as redes sociais. Às vezes, acidentalmente, fazia check-ins em lugares estranhos. As pessoas acreditavam e ligavam para os filhos fazendo encomendas. Foi assim que ela viajou para Curitiba, Flórida, Mato Grosso e China.

Mas nenhuma história supera a do famoso “Armarinho”, que a filha Diana faz questão de contar aos risos: “na verdade, era o seu guarda-roupa, que apelidamos de 'Armarim'. Tinha de tudo! Se a gente precisava comprar um presente de última hora, ela tirava de lá. Se queríamos algo para vestir, resolvido, tinha lá também (havia peças de todo tamanho!). Uma vez ela nos deu até espremedores de alho. Era como uma lâmpada mágica ─ deseje e, de repente estava lá!”

Também foi uma grande sonhadora. Um ser humano que transbordava em afeto, empatia e bondade. Sempre torcendo pela felicidade dos filhos e fazendo de tudo para que tivessem uma boa vida. Conheceu muita gente em sua jornada e recebeu muito amor em vida.

Após oito dias do seu aniversário, precisou ser internada e lutou bravamente pela vida. Tia Val partiu com a certeza de que havia construído um legado imenso e inspirador.

Diana conta ter eternizado em seu corpo uma das doces lembranças de sua mãe: “Ela nos amava muito. Tanto que tatuei um dos seus bilhetes pra mim. Não havia hora para recebê-los. Penso nela como nosso lindo e perfumado anjo da guarda”, e finaliza: "Um pouquinho da nossa felicidade foi com ela, nossa matriarca, nosso pilar. Mas vamos nos recuperar, porque esse, tenho certeza, é o desejo dela: nos ver dando risadas juntos, como sempre fazíamos”.

Valdelice nasceu em Fortaleza (CE) e faleceu em Fortaleza (CE), aos 70 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelo sobrinho e pela filha de Valdelice, Leandro e Diana de Vasconcelos Nunes. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Thiago Santos, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 11 de dezembro de 2020.