Valleria Neres Oliveira Souza

1990 - 2020

Destemida e defensora feroz dos injustiçados; soube conciliar afeto, firmeza e coragem.

"Intensa. Talvez seja esse o adjetivo que melhor a descreva". É assim que Paulo Fernando, um dos inúmeros primos de Valleria, inicia sua homenagem.

Com franqueza e objetividade incomuns, era do tipo que podia assustar de início, contudo, bastava uma proximidade maior para se sentir o quão amorosa e justa ela era. Filha do meio, de um total de três filhos, Valleria transbordava competência em tudo o que fazia, fosse em seu trabalho como vendedora ou na faxina de casa. Doava-se pelo que acreditava e lutava pelos que amava, tudo isso com seu jeitão firme. Se teve medo de algo na vida, soube esconder muito bem.

Cresceu em meio aos rios, à beira dos quais acampava com a família; nas fazendas em que o pai trabalhava; na rua, onde brincava de bete, pé-no-litro e esconde-esconde, e no quintal da Vó Nice. Nascida numa família cuja matriarca, a avó materna, teve 16 filhos, Valleria teve muitos primos, com os quais compartilhou momentos inesquecíveis e com quem cresceu e, para sempre, se conectou.

"Ela sempre teve ‘gênio forte’, como dizemos por aqui. A maneira de se expressar era marcada por uma franqueza que vez ou outra incomodava, pois ficava no limite com a grosseria. Claro que a vida adulta foi permitindo um aprimoramento no comportamento e na comunicação, mas havia muitos xingamentos e entonação de voz firme. Não era alguém que levava desaforo. Isso pode soar como algo beligerante, mas, em verdade, acabava, quando não afastando uns, aproximando outros. Isto é porque ela era firme em suas convicções e esse seu modo de ser era em tudo, inclusive para defender as pessoas que amava ou mesmo enfrentar quem quer que fosse para fazer cessar injustiças", conta Paulo Fernando. E ele complementa: "Aliás, tinha uma força imensa para enfrentar o que considerava injusto. Ela cuidava muito bem dos seus e, à sua maneira, queria ajudar todos que lhe eram caros, inclusive, algumas vezes, puxando suas orelhas e constantemente se dispondo a escutar carinhosamente seus desabafos".

Valleria Gostava muito de beber e escutar sertanejo, sempre com um sorrisão largo no rosto, brincando, alegrando e espalhando risadas. Também tinha fé e, além do desejo de ser mãe, possuía outro grande sonho: ser advogada trabalhista.

Com muito custo, tornou-se bacharel em Direito, mas não foi aprovada no exame da OAB de início. Então, arregaçou as mangas e, enquanto não conseguia a almejada carteira da OAB, trabalhava em outras funções. Considerava todo trabalho digno e era muito boa no que se propunha a fazer, desde ser vendedora até limpar a casa de pessoas próximas em troca de um dinheirinho.

Em 2020, estava se preparando para iniciar novamente os estudos para o Exame de Ordem. Dessa vez, já havia adquirido o curso preparatório e, com brilho nos olhos, planejava ficar integralmente dedicada, prestar o exame e se tornar uma advogada.

O sonho da maternidade, adiantado a outras pessoas, também nem sequer se aproximou da realidade: o filho que um dia imaginou que teria, cujo nome já estava escolhido, Bernardo, nunca será gerado.

Era de uma fibra moral tremenda e de um acolhimento incrível com a família e os muitos amigos que hoje, sem dúvida, são testemunhas de sua passagem curta e inesquecível pela vida terrena.

Foi muito amada e seguirá sendo, ocupando espaço candente no coração de sua mãe, pai, irmãos, sobrinhos, tias e tios, primas e primos e amigos.

"A recordação de sua voz grave e seu jeito brincalhão seguirá conosco como um acalento pelo último abraço que nunca pudemos lhe dar", finaliza Paulo Fernando com o coração tomado pela saudade, mas grato por ter tido a oportunidade de conviver com a inesquecível e amada Valleria.