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Vilma Aparecida da Silva

1976 - 2021

Vilma sorria ao atender o telefone, lia as entrelinhas e dividia seu conhecimento.

Vilma tinha o corpo como armadura e as palavras como sua arma mais poderosa.

Mãe, escritora, professora, amiga — não só dos filhos, mas de todos que a conheciam. Uma poetisa que tinha seu poema favorito decorado e que deixou para os filhos Hayssa, Geovana e Matheus, amor e carinho em forma de poesia, escrita há vinte dias de seu falecimento.

"Filho, muito cuidado! Há perigo na esquina. A polícia não tá lá.
Filho, cuidado. Não saia desprevenido, celular à mostra, ouro no pulso, carteira no bolso de trás.
O perigo está iminente.
Filho, cuidado. Saquearam o mercado, atiraram na vizinha, estupraram a inocente, empurraram-na do prédio, calaram o seu choro.
Filho, esteja atento. O amor está esfriando, as igrejas esvaziando... O hospital está lotado e o médico do SUS faltou.
Filho, cuidado. Tem um inimigo oculto que pede a sua cabeça.
Esteja atento. O inimigo é perspicaz. É inteligente, se veste de cordeiro.
Filho, eu já passei por isso. Só quero protegê-lo. Sei bem como é.
Filho, durma com a luz acesa. A escuridão oculta sombras.
Filho, cuidado. Há perigo na esquina! E sua mãe também não está lá."

Geovana, a filha do meio, é quem enaltece as palavras da mãe e acrescenta: "Era ela quem sempre estava presente nos momentos certos e, principalmente, nos incertos, fortalecendo-nos quando tudo parecia ruir. Nossa mãe gerou, cuidou e nutriu. E amou incondicionalmente. Para ela, a vitória traduzia-se em nossa felicidade e na de seus alunos".
Geovana lamenta a partida da mãe tão nova, mas crê que esse seu jeito de ser, a levou a alcançar a imortalidade. "Às vezes, me pergunto quanto ela media, pois sua sensibilidade era sem tamanho".

O amor de Vilma pelos filhos era desmedido, incontido e infinito. Ela também acreditava em amor à primeira vista e, sendo sinônimo de amor, partiu em um Dia dos Namorados.

"Nossa mãezinha brilhou tanto na Terra que Deus a levou para ser estrela lá no Céu", despede-se a filha, com carinho eterno.

Vilma nasceu em Barra do Bugres (MT) e faleceu em Cuiabá (MT), aos 44 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Vilma, Geovana Carla da Silva Ghisleri. Este tributo foi apurado por Rayane Urani, editado por Denise Pereira, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 28 de abril de 2022.