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Adriana da Silva Santos

1977 - 2021

Preparava bolos caseiros com esmero, fosse para um simples café da tarde ou uma grande celebração.

De jeito alegre e animado, Adriana mantinha o bom humor e disposição sempre presente para promover os encontros em família, ocasiões que lhe davam, juntamente com outras alegrias e celebrações, o motivo para se colocar na cozinha e juntar os ingredientes para seus bolos caseiros, preparados com base nas receitas de sua mãe e mestra nesse ofício. Para agradar aos filhos Mayara e Wendel, o sabor da vez era o chocolate, mas ela mesma gostava, na verdade, de bolo de coco.

Adriana manifestava seus agrados, quase sempre, por meio do preparo caprichoso da comida. Para a primogênita, a memória gastronômica fala alto: “a lasanha e o estrogonofe da minha mãe eram uma delícia, ela tinha uma receita própria”. O arroz e feijão congelados na geladeira deram à prole “o último gosto da comida da mãe” já ausente, relembra Mayara em tom saudoso.

Irmã do meio entre os quatro filhos de Fátima e Nilton, Adriana retribuiu os carinhos da mãe ao final da vida de ambas com cuidados contínuos depois de um acidente vascular cerebral que acometeu a matriarca. “Minha mãe se dedicou totalmente a cuidar da minha avó.”

Quando mais jovem, no entanto, Adriana foi bastante ativa na ocupação profissional. Com o ensino médio concluído, trabalhou como assistente de um escritório de arquitetura por muitos anos, até o nascimento do segundo filho, quando resolveu largar o serviço para se entregar exclusivamente à maternidade. “Ela era grudada com meu irmão. Já nós duas às vezes tínhamos alguns desentendimentos e dávamos ‘choque’”, brinca Mayara ao falar da amorosidade da mãe. “Ela sempre foi bem ligada á família, sempre amou estar junto, sempre parceira. Extremamente carinhosa, fazia de tudo por nós.” E completa: “no começo da pandemia, dizia que queria guardar a gente dentro de um potinho”, em sinônimo de proteção. A moça ainda rememora os brinquedos e mimos que Adriana lhe trazia na infância, época em que a menina era cuidada pelos tios enquanto a mãe garantia seu emprego para o sustento em família.

A juventude marcada pelo namoro e casamento com Marcelo, seu colega de classe nos primeiros anos de escola, inclusive deu vazão à sua alegria de ir a shows e apreciar as músicas da Xuxa, de quem era fã. Aliás a música era uma constante em seu cotidiano; ao som de artistas como a dupla Sandy e Junior e a italiana Laura Pausini, ela viveu incontáveis momentos de alegria pura. As quermesses também eram um programa com a turma de amigos; em uma delas, confessou ter dado seu primeiro beijo, conforme narra a filha com graça.

As lembranças maternas preenchem a rotina de Mayara em fase de pré-natal. “Ela queria muito uma neta para encher os cabelos enrolados da bebê de ‘frufru’”, diverte-se. “E todos os dias me mandava uma mensagem de ‘bom dia’ com alguma foto minha antiga, dizendo ‘essa está linda’, por pior que estivesse.”

Adriana nasceu em Carapicuíba (SP) e faleceu em Barueri (SP), aos 44 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela filha de Adriana, Mayara da Silva Santos. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Fabiana Colturato Aidar, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Ana Macarini em 8 de outubro de 2023.