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Alcione do Socorro Souza Gomes

65 - 2021

Ser avó foi sua melhor versão. Deixou boas lembranças nos filhos do ventre e do coração.

Muitas são as memórias que ficaram de Alcione desde o seu tempo de trabalho na Prodepa quando, todas as manhãs, antes de sair de casa, dava um beijo com batom na bochecha da filha Thaís e ela passava o dia sem deixar ninguém tocar no seu rosto para resguardar aquele sinal de amor e proteção.

Ficaram também o cheiro do patchuli, a sensação do toque macio e quentinho, a lembrança do tom de voz alto, o acolhimento único, o sabor da maniçoba e da carne assada que só ela sabia fazer – registros eternos da vida intensa que viveu.

O time das Cajazeiras está sentindo muito a sua falta porque ela não era apenas uma integrante comum. Era mais do que isso. Era a sua cerimonialista, que partiu e o deixou sem script, sem roteiro, sem saber o que fazer.

Alcione era dona de várias habilidades. Dentre elas, destacava-se a de se expressar por meio da escrita, com a qual presenteou Thaís em seu último aniversário com um texto reportando o dia do seu nascimento. Nele, segundo a filha, “falavas que aquele seria o primeiro dia que não seríamos mais uma só, davas à luz a mim, um ser vindo de ti, do teu ventre e fruto do teu grande amor pelo papai”.

Emocionada, Thaís acrescenta, sobre a relação única que tinha com Alcione: “Éramos melhores amigas. Minha mãe era a pessoa que mais me amava neste mundo, tínhamos uma ligação muito forte. Ela vai viver em mim pra sempre”.

Sua despedida contou com poucas pessoas, mas que mostram tudo o que a tocou significativamente na vida:

Alcideli e Pedro representam a sua família de origem em nome dos demais, que não puderam estar presentes.

Victor, com muito mérito, simboliza todos os filhos não gerados no seu ventre, mas que nasceram do seu coração, como Family, Gabi, Lene e outros tantos que a tinham como uma mãe.

Bruno personifica todos os alunos e amigos de profissão que se beneficiaram do seu prazer e arte de ensinar com amor.

Por fim, Thaís e Eduardo representam o seio da família Gomes, constituída ao lado do marido, em nome de Suzy, Lucas, Davide, Jessyca, João, Targo e Elis.

As suas lições de como não viver presa às exterioridades do corpo foram aprendidas e o seu último desejo foi atendido: ser cremada e ter as cinzas depositadas ao pé do jambeiro, onde descansará pela eternidade, como sempre quis.

Alcione viverá ao lado do companheiro de vida, organizando contações de belas histórias no Céu como tão bem fazia aqui na Terra.

Alcione nasceu em Belém (PA) e faleceu em Belém (PA), aos 55 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Alcione, Thais Sousa Gomes. Este tributo foi apurado por Rayane Urani, editado por Vera Dias, revisado por Paola Mariz e moderado por Rayane Urani em 29 de abril de 2021.