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Antonio Soares Alves

1967 - 2020

Gostava de dançar forró e tomar cerveja com a família. Viveu de mãos dadas com a simplicidade.

Forró no rádio e cerveja na mão. Antonio saiu de Itapipoca, no Ceará, atrás de uma vida melhor. Ganhava a vida como vendedor de ferramentas, numa banquinha no centro de São Paulo.

De segunda a sexta, estava sempre por ali. Permanecia quieto e concentrado à espera do próximo cliente, embaixo de um boné. Tinha vários, de muitas cores. Nunca saía de casa sem usar um deles.

No mercado onde as sobrinhas trabalham como operadoras de caixa, a visita diária era certeira: leite e bolo, consumidos na hora do jantar, eram os cativos da cesta de compras. O menu da conversa também era econômico: começava com um sorriso, seguia pela curiosidade se estava tudo bem e terminava com um "até amanhã".

Um cuidado quase calado, que tomava outro jeito nos almoços de domingo em casa de Tia Maria. Ali, ele se sentia à vontade para recordar os dias no Ceará. Chorar de saudade e encaixar as lágrimas nos contratempos do triângulo, enquanto dançava com uma das sobrinhas.

Mantinha as coisas em casa muito bem-organizadas. Tudo limpo. Impecável. Não conseguiu se despedir da família. De tanto perder celulares, abriu mão de comprar o aparelho. Mas sabia que jamais esteve sozinho.

Antonio nasceu em Itapipoca (CE) e faleceu em São Paulo (SP), aos 52 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela sobrinha de Antonio, Cristiana Alves de Sousa Lima. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Juliana Parente, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 16 de agosto de 2020.