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Aureo de Souza Costa

1952 - 2020

Foi caminhoneiro e tinha muitas histórias. Deixou gratas recordações para os seus.

Aureo casou-se com Claudionora e com ela teve três filhos e três netos. Durante a infância dos seus filhos, não demonstrava seu afeto através de beijos e abraços, o que também contribuiu para que seus gestos tivessem um tom rígido. "Ele sempre foi muito presente, nunca nos deixou faltar nada. Deu tudo do bom e do melhor para nós e para a nossa mãe. Porém, sempre foi autoritário e teimoso", conta a filha Daiana.

Ele também era uma pessoa ativa, batalhadora e que tinha propriedade para falar das estradas do país. Afinal, foi caminhoneiro por anos, o que rendeu muitas histórias.

"Meu pai conhecia a estrada como ninguém. Se ele começasse a falar das viagens e dos trechos por onde passou, ficávamos horas escutando-o. Nos ensinou a dirigir ainda moleques e sempre me dava dicas e explicava como fazer em cada ponto do caminho. Quando retornava das suas viagens de 15 dias, sempre trazia algo para nós. Ele só podia permanecer em casa por um final de semana, então, nos levava para almoçar no domingo e, na madrugada, já pegava a estrada", conta ela, e prossegue: "No período em que ele trabalhou embarcando e desembarcando carretas no porto, inventava carrinhos de rolimã para o meu irmão e para mim, que sempre adorei. Aos sábados, ele nos levava para o trabalho e ficávamos vendo o movimento na balsa. Também viajávamos de Porto Velho até a capital paulista e, nas férias de fim de ano, nos aventurávamos de vez nas viagens, correndo nos pátios dos postos de combustíveis à beira da estrada."

Aureo não escondia o orgulho que sentia dos filhos e os defendia com "unhas e dentes". Mas a cobrança era constante em relação aos estudos e apenas após a conclusão deles é que os namoros seriam permitidos por ele, que dizia: "É cedo, não está na hora".

Aonde quer que fosse, Aureo disparava elogios à sua família, à qual se dedicava por inteiro. Nos domingos, adorava um bom almoço na presença de familiares e amigos, acordando cedo para preparar os costumeiros churrascos, e também adorava ficar na cadeira de balanço da varanda, lendo o jornal do dia.

A convivência tornou-se mais difícil quando Aureo aposentou-se devido à perda parcial da visão, causada pela diabetes. Para ele, lidar com a doença e com a vida fora das estradas foi um grande desafio. Só não foi difícil lidar com os netos e lhes encher de carinhos.

"Que avô ele foi! Quando chegava um neto, ele corria para abraçar, beijar e dar muito carinho, que são coisas que não fazem parte das minhas lembranças de infância", diz Daiana, que acrescenta: "Acredito que o meu pai desejava que fôssemos o que ele considerava ser o melhor. O aprendizado vai ficar, pois depois de casados e com filhos, que precisam ser educados, somos capazes de entender o que ele tanto buscava. Não é saudosismo, não é reviver o passado apenas, mas é me valorizar através dele e do seu legado. É saber que, para seguir em frente, é preciso acolher nosso passado e deixar que as experiências vividas nos tragam sabedoria e nos deem a força e os significados necessários para vivermos o agora."

Aureo nasceu em Guarulhos (SP) e faleceu em Porto Velho (RO), aos 67 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Aureo, Daiana Costa. Este tributo foi apurado por Jonathan Querubina, editado por Luciana Fonseca, revisado por Paola Mariz e moderado por Rayane Urani em 20 de agosto de 2020.