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Benedito Antonio de Oliveira

1942 - 2020

Um querido teimoso que amava a liberdade de poder decidir sobre sua vida.

Esta é uma carta aberta de Aline para o seu avô Benedito, com quem morava desde o início da faculdade:

Sou muito grata por todos os momentos que tivemos juntos e, principalmente por poder estar contigo nos seus últimos instantes, a céu aberto. Estava lá por você, pela minha amada mãe e pelos meus tios, que mesmo não se sentindo bem, também estavam presentes.

É, Ditinho... Se existisse um Reino da Teimosia, com certeza, lá você seria o Rei. O que mais teimava era para poder viver sua intocável independência. O mais fantástico era me encontrar tocando em sua independência e te mostrando de alguma forma, mesmo que sutilmente, que não há problema algum em ser cuidado.

E quem diria que você se renderia aos aplicativos, hein? As folhas, com as inúmeras anotações, corriam o risco de serem substituídas. O gás trocado continua anotado, a pilha trocada, as infinitas contas que nem precisavam ser colocadas no papel, afinal, você era praticamente uma caixa registradora.

São muitas, mas muitas lembranças que ficarão para sempre comigo: seu feijão delicioso; a fascinação pela exploração do ouro; as inúmeras tentativas na loteria dos seis números, salvas por algumas quinas acertadas; a música sertaneja que ecoava na casa no meio da tarde; todas as vezes que me acordava para avisar que estava saindo; as piadas e os péssimos trocadilhos que notei possível herança minha.

Como era vaidoso com o cabelo! Como ficava charmoso com aquele chapéu! Lembro-me das histórias do trabalho, das de terror, das superstições sem nexo algum. Lembro-me de quando levava chocolate para mim e de quando me pedia para fazer arroz. Tantas lembranças queridas!

Pode deixar, vovô, que seus bisnetos saberão quem você foi.

Despede-se, com muita saudade, a neta Aline.

Benedito nasceu em São José dos Campos (SP) e faleceu em São José dos Campos (SP), aos 78 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela neta de Benedito, Aline de Oliveira. Este tributo foi apurado por Andressa Vieira, editado por Míriam Ramalho, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 8 de dezembro de 2020.