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Benito Allex Gama

1967 - 2020

Podia ser feliz em um chalé na roça ou numa viagem ao Egito porque era feliz de verdade.

Técnico em enfermagem muito dedicado, "Bê" era alegre e querido por todos. Reconhecido como a alma do Hospital de emergência de Resende (RJ), chegou até a receber o apelido de “Plaquinha de Patrimônio do Hospital”. Trabalhou em praticamente todos os setores, mas foi no centro cirúrgico que encontrou sua paixão. Todos tinham muito respeito pelo conhecimento técnico que ele possuía e, até os cirurgiões novatos, muitas vezes, se rendiam ao jeito firme dele. Adorava quando as cirurgias eram ortopédicas. As mesas e instrumentos eram meticulosamente organizados.

E não se engane quem pensa que essa organização ficava só no trabalho. Era muito vaidoso, andava sempre cheiroso. Fazia rotineiramente as unhas, e o cabelo estava sempre impecável e com a pintura em dia. Barba por fazer?! Jamais! Era cliente assíduo da Rita Luzinete, consultora de uma marca de produtos de beleza; ele investia mesmo em todos os cuidados pessoais.

A alegria dele era tão grande que se espalhava pelos corredores do hospital, contagiando os pacientes, seus colegas de trabalho e todos com quem tinha contato, tornando o dia a dia e a rotina no ambiente hospitalar algo mais leve e com certeza contribuindo para a cura de tantas enfermidades do corpo e da alma.

Essa alegria o acompanhava pelas ruas da cidade e em casa. Sua grande família cheia de irmãos, irmãs, sobrinhos e até sobrinhos netos experimentava, além dessa alegria, sua generosidade; Benito não permitia que ninguém passasse necessidade, ajudava a todos com muito amor, sempre. Tinha uma atenção especial com a mãe, a D. Rosa, cuja saúde fragilizada
requeria cuidados especiais.

Era um sonhador! Um de seus sonhos era morar em um chalé na casa da roça de sua amiga Luci, o outro - mais ambicioso -, era uma viagem até o Egito, na companhia da inseparável amiga.

Luci o conheceu quando ainda era uma criança, por volta dos oito anos de idade, durante um churrasco na casa do tio dele, colega de trabalho de seu irmão. A menina ficou muito tensa no trajeto, pois tiveram de atravessar um estreito pontilhão que passava sobre um rio. Como era pequena, sentiu-se bastante assustada, e o irmão não foi muito habilidoso para acalmá-la. No entanto, assim que chegaram ao local do churrasco, Luci conheceu Benito, um menino pouco mais velho que ela que foi muito receptivo; começaram logo a brincar, ela esqueceu o incidente e ali nasceu uma linda amizade que duraria décadas.

Luci esteve com "Bê" até o final. Foi quem o levou ao hospital para se tratar da Covid, ela também teve que se internar por conta da enfermidade, passando por momentos difíceis. Mas, logo que pôde, voltou ao hospital para garantir que o amigo tivesse as unhas lixadas, do jeitinho que gostava, assim como o cabelo e a barba feitos. Assim que recebeu esse carinho final de sua querida amiga, ele partiu.

O sonho de viajar para o Egito e mesmo o sonho de morar ao lado da amiga na roça, apesar de não terem sido formalizados, foram motivo de grande alegria para "Bê", foram sopros de esperança em sua vida. Afinal, viver sem sonhar, não é viver de verdade. E Benito viveu de verdade, foi pura energia de luz, preencheu a vida de todos ao seu redor de cor e alegria. Por isso, permanecerá vivo na memória daqueles que o amaram e que foram amados por ele, para sempre.

Benito nasceu em Resende (RJ) e faleceu em Resende (RJ), aos 53 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela amiga de Benito, Luci da Silva. Este tributo foi apurado por Thaíssa Parente, editado por Ana Clara Cavalcante, revisado por Ana Macarini e moderado por Rayane Urani em 26 de janeiro de 2021.