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Carlili Lira Vasconcelos

1949 - 2020

Tinha o dom de escrever, eternizou em poemas a vida, as pessoas e o tempo.

As pessoas nunca acertavam o seu nome e muitas vezes o chamavam de Carlinhos. Já os da família, sempre o chamavam de Ca. Era filho de Neusa e Jaime, e irmão de Vera, Ivan, Janete, Jairo, Jaine e Suerda. Do pai herdou a profissão de eletricista e foi parceiro do irmão Ivan em seu outro ofício: o de escritor.

Desde pequeno trabalhou como eletricista e era muito conhecido pelo seu serviço em sua cidade. Usava somente botinhas! Nunca viram Carlili de tênis. Sempre estava de botas para proteger os pés — era sua marca registrada. A família escutava de longe quando ele estava chegando e passando pelo quintal. Uma outra curiosidade sobre ele é que chegou a ser carroceiro por um tempo.

Carlili costumava assobiar suas músicas favoritas e tinha uma coleção de LP’s. Com a esposa, apreciava as canções de Roberto Carlos e desde cedo apresentou à irmã, Suerda, todos os seus estilos musicais preferidos: Clara Nunes, Elis Regina, Alcione, Demônios da Garoa. Seu sonho era ir a um show de André Rieu, o violinista holandês!

Passava suas horas livres escrevendo, lendo e ouvindo músicas. Deixou mais de 50 poemas, que a irmã caçula espera um dia publicar. Carlili tinha uma maneira única de enxergar a vida; escrevia sobre o tempo presente e sobre as pessoas. Tinha o dom de expressar os sentimentos em palavras. “Em 2014 fizemos o lançamento do livro “Nove Vidas e uma História”, que ele escreveu junto com Ivan, nosso falecido irmão. É uma história linda de superação e reencontro dos irmãos. Como ele sempre dizia, foi um dos dias mais felizes da nossa vida. Foi uma surpresa”, conta Suerda.

Ele era a generosidade em pessoa. Muito apaixonado pela família, fez de tudo por eles o tempo todo. Nunca houve desamparo. Gostava de crianças: quando os bebês da família nasciam, era ele quem levava as mamães ao hospital para tê-los. A afilhada Mariana, a Mari, era especial para ele; era um querer tão grande, que se dizia ser de outras vidas. Era apaixonado pelo mar, apesar de ir pouco, e quando ia gostava de levar a família no próprio carro. Na Páscoa, distribuía ovos de chocolate. E entre as doces memórias, sua irmã, Vera, lembra do hábito de comerem frutos verdes no pé.

Ca e a esposa Terezinha conheceram-se no bairro da Bela Vista - em Itapevi onde moravam - inclusive, na mesma rua. Foram casados por cinquenta e um anos e eram conhecidos por serem defensores dos animais. Cachorros eram sua paixão. Carlili chegou a ter 21 animais em casa. Resgatava e abrigava aqueles que eram abandonados na rua ou deixados na porta de sua casa. Não podia ver o sofrimento desses animais, pegava logo para cuidar.

Almas gêmeas, Cá e a esposa, não tiveram filhos, e despediram-se do plano terreno com diferença de vinte e cinco dias. Ela foi na frente, vitimada por um câncer, para deixar tudo pronto para sua chegada, que deve ter tido a trilha sonora desse amor: canções de Roberto Carlos.

Carlili foi um homem de muitas virtudes, sendo a generosidade a maior delas. Foi companheiro, amoroso e paciente, e deixa uma bonita lição de amor ao próximo e aos animais.

Carlili nasceu em São Paulo (SP) e faleceu em São Paulo (SP), aos 71 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela irmã de Carlili, Suerda Vasconcelos Reder. Este tributo foi apurado por Luisa Pereira Rocha, editado por Ana Clara Cavalcante, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 14 de dezembro de 2021.