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Celeste Henriques Silva

1928 - 2020

Congelava o nome dos jogadores de futebol do time adversário para que eles perdessem a partida.

Celeste sempre foi muito querida e muito popular, andava na rua e todos paravam pra cumprimentar. Era uma mulher intensa, corajosa e muito ativa. Ela que já foi cabelereira e assistente de contabilidade tinha riso fácil, mas podia ser também muito incisiva. Quando criança em Vitória, vivia rasgando sua mochila de tanto bater com ela nos meninos que a perturbavam; por sorte o seu tio era sapateiro e sempre a consertava no caminho de volta para casa para que seus pais não percebessem nada. Era filha de ferroviário e por isso se mudou algumas vezes durante a juventude. Nasceu em Marataizes, ainda jovem se mudou para Coronel Fabriciano e Vitória. Depois para o Rio de Janeiro onde conheceu aos quinze anos a paixão da sua vida e quiseram namorar, porém por ser muito nova seus pais não deixaram e ele, por sua vez, acabou por se casar com outra mulher.

Diziam que quando jovem, Celestinha, como era carinhosamente chamada pelos mais íntimos, queria ter ido embora com o circo. A fuga ficou no desejo, mas sua vida foi tão alegre quanto poderia ter sido num picadeiro: ela brincava até com os passarinhos do seu jardim. Celestinha também adorava ver novela, fazer crochê, ler, cuidar das orquídeas dela, passar um cafezinho. Mesmo já com uma idade avançada Celeste continuava com toda energia e sempre dançava em toda festa que ia e aos 92 anos tinham muitos planos de vida e sempre foi lembrada pela sua alegria de viver: Celeste nunca desanimou da vida em nenhum momento.
atividade que ela adorava praticar era cozinhar: não havia nada que fizesse na cozinha que todos não adorassem.

Até a salada que fazia tinha um gosto especial. Aos domingos costumava fazer um bolo para tomar com café que chamava de Simples, mas que apesar do nome era a causa deleite de quem comia: ela tinha uma mão mágica para cozinha. Além da culinária outro costume que celeste tinha era o de trancar todas as portas da casa sempre que saia: não só as de fora, mas todas, inclusive a dos quartos.

Mas a sua magia não se restringia a cozinha. Era uma mulher forte e ligada ao tempo e aos acontecimentos, muito inteligente e politizada: falam que desde muito pequena sempre teve opinião sobre tudo. Além disso também tinha um conhecimento sublime: tinha simpatias para solucionar todos os males. Ela era uma torcedora fervorosa do Cruzeiro e colocava os nomes dos jogadores do time adversário no freezer para o Cruzeiro ganhar o jogo. Já quando alguém sofria de ressaca ela preparava seu infalível chá de necroton, que melhorava o mal-estar rapidinho. Celestinha também sempre calculou o sexo de todos os bebês da família. Esse método era carinhosamente chamado pelos seus netos queridos de “mandinga da vovó”. Um cálculo louco que sempre deu certo. Ela também costumava rezar para todos filhos e netos as 6 da manhã e ao meio-dia, sem nunca falhar e os netos que moram fora ganhavam rezas separadas. Extremamente caridosa estava sempre ajudando a todos e já chegava com soluções para os problemas.

Celeste era uma ótima conselheira, ensinava sobre a vida e era um exemplo de alma caridosa e cheia de amor: era a pessoa para se ligar nos momentos de incerteza. Se divertia ao contar aos seus netos muitas histórias que viveu no tempo em que trabalhou no centro do Rio de Janeiro e sobre o Piscinão na Ramos. Ela era uma mulher muito carinhosa: dizia em segredo a todos seus netos “você é o meu preferido”. Depois quando eles descobriram isso nada mudou: de fato todos continuaram sentindo assim, pois ela realmente tratava cada um de maneira única e muito especial. Sempre foi muito querida e muito popular, andava na rua e todos paravam para cumprimentar. Era a amiga para todas as horas de todos seus familiares. Todos corriam para o colo dela nos fracassos e para comemorar cada vitória.

Dois anos depois de ter conhecido o seu amor, após o término do casamento dele e estando ela já um pouco mais velha os dois se reencontraram e finalmente, com a aprovação dos seus pais, eles se casaram e se mudaram para Osasco, SP. Lá, ela e Homero juntos tiveram sete filhos: Maria das Graças, Luis Cesar, Rita de Cassia, Paulo Tarso, Homero, Helio e Sergio. Esses por sua vez trouxeram ao mundo seus treze netos e sete bisnetos, cujos maior exemplo de amizade, carinho e caridade foi Celeste, que como o nome já diz e a realidade não nega, parecia ter vindo do céu.

Celeste nasceu em Marataízes (ES) e faleceu em Belo Horizonte (MG), aos 92 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pelas netas de Celeste, Ana Carolina e Juliana. Este texto foi apurado e escrito por Lucas Rangel, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 13 de setembro de 2021.