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Claudio Antônio Lopes Ferro

1976 - 2020

Transformou o Natal e o Ano-Novo da rua em uma tradicional queima de fogos.

Cláudio foi um bebê chorão, só ia no colo da mãe, do pai e da avó Maria. O nome foi uma escolha do pai, que o chamava de "Claudinho do pai". Doente quando criança, curou-se de tanta oração (fora as simpatias, garrafadas, rezas, promessas e até medicina).

Em 1978, quando ganhou uma irmãzinha, sua mãe ficou internada e ele logo aprendeu a cuidar da pequena. No ano seguinte, mais uma irmã e ele sempre a mostrar seu carinho com a família.

Seu pai sempre foi um herói, mas partiu muito cedo, de forma repentina. Aos quatro anos de idade, Claudio se viu órfão. Por conta do trauma, desenvolveu gagueira e sua heroína passou a ser a mãe. Reinventando-se, assim como as bravas mulheres da família, aos poucos ele passou a assumir responsabilidades e cuidados com elas. Ainda jovem, já nos primeiros anos de escola, passou a ser o defensor da casa e das irmãs.

Mas era uma criança ainda... brincando de passa anel, coelho na toca ou qualquer outra coisa. No super quintal da casa, cheio de árvores, tinham de tudo: galinheiro, coelho em um banheiro, cachorros no muro e porquinho da Índia em uma caixa d'água desativada.

A rua, ainda sem iluminação, era o cenário perfeito para brincar de esconde-esconde. Quando chegou a iluminação da rua, foi a tristeza da garotada: ficou fácil de achar...

Cláudio não parava. "Gostava de correr atrás de nós pela casa. Morder os nossos pés. Subíamos no pé de orvalho e jogávamos ovos nas pessoas: primos e primas, todos juntos. Crescemos brincando na rua", lembra com carinho a irmã mais nova, Josiê.

A infância e adolescência foram boas. Até que todos cresceram. Cláudio, um sonhador. Conseguiu seu primeiro emprego numa fábrica de pipocas do bairro. O almoço feito com carinho pela avó, as irmãs levavam todo dia. Trabalhando e planejando seu futuro, trabalhou depois em uma fábrica de móveis e no restaurante do Seu Sérgio. Cauteloso, guardava boa parte do salário para a faculdade. A mãe sonhava com o filho engenheiro.

Sua grande ambição era casar, ter filhos, ser pai. Seu grande amor veio no colegial. Jogos interescolares: Colégio Gama contra o Cícero, e eis que apareceu a Célia. Encontrou o amor e foi correspondido. Namoraram e terminaram algumas vezes, até que pegou o dinheiro guardado, fez sua primeira casa e se casou com a amada. No dia do casamento, quem atrasou foi ele... teve até dor de barriga.

A casa lotou de crianças. Seu primeiro filho, depois o segundo. Afilhada, sobrinho... veio o terceiro filho e mais sobrinhos. A prole e a alegria só aumentavam.

Fez faculdade de matemática e começou a lecionar. Surgiu a militância política pela causa da educação. Acreditava em lideranças honestas. Participava da igreja do bairro. Santista convicto, cozinheiro nato, churrasqueiro da família, cantor das festas familiares. Ele era tudo isso e ainda adorava praia, cerveja e feijoada.

As festas familiares tinham sempre seu toque mãos. Seu sorriso e seu sabor eram a marca registrada. São tantas lembranças que dariam um livro, uma biografia.

"Você perdoava, aceitava os nossos defeitos. Dava o que tinha, e se não tinha, dava um jeito. Adorava se arrumar, tirar fotos...vaidoso que era.

"O amor não morre, ele fica no coração... O alívio que tenho hoje: não temos palavras não ditas. Amo você!", afirma a irmã Josie, em nome de toda a família.

Claudio nasceu São Paulo (SP) e faleceu São Paulo (SP), aos 43 anos, vítima do novo coronavírus.

História revisada por Julio Casimiro, a partir do testemunho enviado por irmã Josie Lopes Ferro, em 10 de dezembro de 2020.