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Elisa da Silva Coimbra

1955 - 2020

Sempre de bem com a vida, ajudava a quem podia e nunca guardava mágoas. Era um anjo disfarçado entre nós.

Este texto foi escrito por Marcos da Silva Coimbra, filho de Elisa da Silva Coimbra:

Era uma noite de quarta-feira, dia 12/08, quando, após notar que ela permanecia com sinais de cansaço, mesmo após ter ficado deitada boa parte do dia, ficando ofegante com o mero ato de sentar-se à cama para tomar um remédio, assim como não sentir o sabor da comida que tentávamos dar a ela, que ela concordou em voltar para o hospital para ser examinada novamente. Não deu nem tempo de beber a vitamina que fiz do jeito que ela gostava a fim de ver se pegava algum sabor, tínhamos que ir logo para o hospital. Ela não queria que eu fosse, afinal, ela sempre achava que devia "poupar" os outros de qualquer coisa, mas cada segundo ainda perto dela era importante, não sendo metade do que ela faria se tivesse no meu lugar.

Ao chegar no Caxias D’or ainda tivemos um contratempo no atendimento, pois não havia ninguém na triagem noturna de emergência no momento em que chegamos, o que nos fez perder mais alguns minutos que pareciam ser horas para mim, agachado ali do lado da cadeira, olhando em sua direção. Notada a gravidade do quadro, a profissional responsável imediatamente levou-a para a área interna. Foi desconfortável vê-la caminhando lentamente, já com a respiração cansada, em direção àquela porta onde nós não podíamos entrar. Mas fiquei com essa cena gravada na minha memória, e com esse último abraço que eu deveria ter arrancado, agora entalado nos meus braços. O lado de lá da porta era mais escuro do que o saguão de entrada, e eu fiquei olhando naquela direção mais de um minuto depois dela já ter saído do nosso campo de visão.

Como eu já suspeitava, ela teve que ficar internada para que os médicos tentassem reestabelecer o padrão de oxigenação, que ainda estava apenas levemente prejudicado. A esperança era de que com alguns poucos dias de ajustes respiratórios e de remédios ela se recuperasse e, passada a janela de transmissão, voltasse pra casa.

Desde este dia foram 43 dias de internação, dos quais 35 sedada e intubada, em que a hora mais esperada e esperançosa do dia era a conversa diária por telefone com a equipe médica, que atualizava-nos sobre as últimas 24 horas dela. Com todos os altos e baixos que tivemos ao longo dessas semanas, passando por um momento de muita angústia com uma crise de falta de ar mais aguda ao atravessar os dias de pico de ação da covid-19 no pulmão, houve uma sequência de dias de mais de uma semana em que ela praticamente só apresentou melhoras, quando enchemo-nos de mais esperanças de que ela pudesse acordar da sedação e que a extubação pudesse ocorrer.

Em um desses dias da sequência de melhoras, escrevi que o quadro dela era estável e em evolução gradativa, que não havia muita coisa a dizer, e que chegaria o dia em que a mensagem seria apenas: "Elisa recebeu alta e está voltando para casa! Será cuidada e amparada por aqueles a quem ela sempre cuidou e amparou."

Após 43 dias de internação, muita oração e muita esperança, quis Deus que sua jornada de volta para casa fosse direto para o céu - agora em festa -, e que não fizesse mais escala entre nós, que ficamos tão mal acostumados com o seu brilho e a forma amorosa e atenciosa com que éramos tratados por ela. Sabemos que tem alguns anjos disfarçados entre nós a fim de espalhar amor, generosidade e compaixão. Elisa era um desses anjos, e nesse momento retorna à sua casa original, onde será recebida e acolhida. Lá no céu ela deve estar dando palpites sobre a organização dos anjos rs. Era sempre assim rs. Uma mestra em cerimoniais...

Agora teremos que nos reinventar. Teremos que aprender a viver sem ela, que já nos deu exemplos e testemunho de vida suficientes para incentivar ou despertar o melhor também em nós, importando-se com a dor ou as dificuldades do outro e que, podendo, fazia de tudo para ajudar. Aqui, seja como mãe, esposa, missionária, filha ou irmã, ela sempre foi admirável e sorridente, tratando a todos com carinho, independente da posição, e dando o melhor exemplo. Pregou a palavra o quanto pôde e fica em nossos corações como a serva de Deus dedicada à Sua obra, fiel e honrada.

Será através dos nossos atos que seu legado será continuado; não apenas nós, os filhos e netos, que a carregamos em nossos genes, ou seu esposo, em quem se imprimiu uma vida inteira de suporte, amparo, dedicação e mesmo abdicação, mas também em todos aqueles que com ela conviveram e puderam aprender com seu afeto e sensibilidade exemplares; e, por isso, ela ganhou tantos outros filhos pelo carinho e pela fé. A responsabilidade agora é nossa, a de mantê-la presente e lembrada através desse melhor em nós, buscando seguir o verdadeiro exemplo de Cristo.

Guardemos aquele sorriso amoroso de Elisa em nossos corações.

"Este mundo jamais pode me separar
Dos valores celestiais que eu vou receber
Meu tesouro e esperança estão no meu novo lar
Sou herdeiro com Cristo, vou com Ele morar
Céu, lindo céu! Céu, lindo céu!
Há mansões celestiais, todas feitas por Deus
Céu, lindo céu! Céu, lindo céu!
Eu vou pro céu, lindo céu
Com Cristo vou morar no lindo céu!"

Elisa nasceu em Queimados (RJ) e faleceu em Nova Iguaçu (RJ), aos 65 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelo filho de Elisa, Marcos da Silva Coimbra. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Mariana Lopes, revisado por Ana Macarini e moderado por Rayane Urani em 29 de dezembro de 2020.