1929 - 2020
Cuidou das irmãs pequenas, sempre acolheu quem tivesse fome e deve estar, agora, tomando um cafezinho no céu.
O filho Ricardo conta que, nos últimos meses, sua mãe, de 91 anos, recorrentemente lembrava-se da própria mãe, Dona Olimphya, que partira, por doença, quando ela era menina, dizendo: "Minha Elzinha, minha Elzinha".
A menina logo tornou-se órfã. Adormeceu a própria infância para tornar-se "mãe" das irmãs, e o fez com uma aplicação tal que foi capaz de abdicar de um casamento, perto dos 20 anos, porque o pretendente não aceitara suas irmãs junto. "Ainda que ele fosse de família bem sucedida, ela então quis por elas, por sua família", conta Ricardo.
E assim foram escritos inúmeros capítulos de uma vida dedicada aos outros, sempre aos outros. Ricardo, ele próprio, por conta dessas escolhas, é filho de um casamento já tardio para os padrões da época, ocorrido aos 33 anos.
E desde então foram tantas histórias, tantos "causos" de beira de fogão à lenha. Não há quem tenha procurado Elza precisando d'algo que não fosse atendido. "Ela sempre atendia. Familiares, amigos e desconhecidos. Não é exagero de discurso póstumo. Quantos pratos eu, ainda criança, distribuí com ela para mendigos?" Ele menciona.
Ricardo conta que a família, mesmo antes do falecimento de seu pai quando ele tinha 18 anos, não tinha uma situação econômica confortável, porém, "mesmo assim havia espaço à mesa para mais um, sempre acomodava-se mais um 'hóspede' em casa".
O tempo passou. "As filhas-irmãs crescidas cederam lugar nos cuidados da 'Elzona', que enfrentou o mundo por nós." Ricardo diz que a mãe foi "incansável" no trabalho junto ao Governo do Estado de São Paulo, cargo para o qual foi nomeada por causa da beleza de um de seus filhos, que encantou dona Leonor de Barros, primeira dama do então governador Ademar de Barros.
Essa história ela não se cansava de repetir:
"A primeira-dama lhe disse:
— Este menino "não existe"!
E Elza não perdeu a oportunidade de situar-se e situá-la:
— Estou funcionária nesta escolinha (uma espécie de creche da época), mas não tenho nomeação.
Dona Leonor de Barros sacou seu cartão e entregou dizendo:
— Passe no Palácio do Governo amanhã cedo."
Assim ela ingressou, e ali permaneceu até aposentar-se. "Ela falava com orgulho do Hospital do Servidor, o Iamspe, onde nasci, nascemos, nos curamos e onde ela embarcou para sua última viagem", diz Ricardo, que repete a despedida de toda uma outra geração: "Meu Ricardinho, meu Paulinho, meu Alexandrinho, minha Genyzinha, minha Irenezinha, minha Dircezinha".
Ele conclui sua homenagem falando diretamente à Elza: "Imagino você pedindo para Jesus um cantinho, um pouco afastado do burburinho, com um fogão à lenha e convidando-O para um cafezinho".
Elza nasceu em Platina (SP) e faleceu em São Paulo (SP), aos 91 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pelo filho de Elza, Ricardo Luiz Chaves Dias. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Phydia de Athayde, revisado por Gabriela Carneiro e moderado por Rayane Urani em 10 de setembro de 2020.