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Eugenia Souza

1949 - 2020

Atravessava a cidade de bicicleta saudando suas pessoas favoritas.

Estimada por diferentes gerações, Dona Eugenia encantava tanto as crianças do bairro em que morava, com a venda de seus picolés, quanto os grandes amigos de longa data que não perdiam a admiração por ela. Com bom humor e riso fácil, conduzia sua simpatia pela cidade em cima de sua bicicleta e, no caminho, parava com frequência para saudar amigos e conhecidos que cruzavam com ela.

Sempre muito atenciosa com todos, em especial os netos e bisnetos, recebeu das netas um modo carinhoso de ser chamada: Uge. Prezava pela unidade na família, estando sempre apegada às irmãs e irmãos. O amor incondicional que demonstrou pelo pai nos cuidados delicados que os 99 anos dele exigiam, foi um fato incontestável do coração altruísta que Dona Eugenia possuía. Desde a casa limpa à comida, ela esteve presente a todo momento retribuindo os cuidados que tanto recebera dos pais.

Vibrante como era, a música que saía do seu rádio deveria estar no último volume - E ai de quem reclamasse!

Mulher de muitos talentos, adoçava o dia de seus clientes com seu famoso doce de mamão - um dos preferidos entre os doces de compota que vendia. A costura também evidenciava sua veia criativa, adorava passar horas em frente à máquina costurando seus tecidos. A imagem de Dona Eugenia durante um dia inteiro entre costuras e pausas para se hidratar com seu Tereré, que estava sempre ao lado, é uma das lembranças mais simbólicas e bonitas para se guardar.

Uma mãe de sete que vivia distante fisicamente de alguns filhos, mas que não deixava a falta de proximidade abalar o carinho e as tradições tão significativas. Era assim com os aniversários de Eugenia que sempre foram muito esperados, momentos em que ela poderia ser o centro das atenções como amava.

“Cantávamos os dez segundos da virada do ano com o "parabéns pra você" já em seguida, e o bolo no fim da tarde do dia 1° de janeiro era sagrado. Filhos e netos, mesmo morando no Paraná, ligavam só para cantar "parabéns pra você" por chamada de vídeo”, recorda com carinho a neta Tamara.

Sua fé inabalável foi parte inseparável de sua existência, era católica e muito devota aos seus santos, principalmente a Virgem de Caacupê.

Acreditava que tudo acabaria bem, que estariam todos reunidos no final de 2020 e conheceria o bisneto Caio, que nasceu um mês depois de sua partida. Apesar de a dura realidade ter se mostrado diferente, a ausência de Dona Eugenia não combina com o silêncio de uma casa vazia, pois ela mesmo dizia que, quando morresse, ao invés de choro, queria festa e música alta - na mesma intensidade de sua presença!

Eugenia nasceu em Porto Murtinho (MS) e faleceu em Campo Grande (MS), aos 71 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Eugenia, Tamara Mendes. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Júllia Cássia, revisado por Luana Bernardes Maciel e moderado por Rayane Urani em 16 de fevereiro de 2021.