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Feize El Kebbe de Almeida

1955 - 2021

A cabocla libanesa que foi uma mãezona da torcida do Boi Caprichoso, em Manaus.

Ela gostava muito de passear, de dar uma volta pelo shopping e de tomar tacacá, mas seu maior hobby era reunir os filhos, organizar um belo almoço familiar e desfrutar da presença deles no aconchego do seu lar. Também apreciava tomar um café e bater um bom papo no final da tarde com sua comadre Lindirsay — uma irmã que a vida lhe dera de presente.

Feize nasceu em Manaus, e ainda era pequena quando, sem a companhia dos pais, ela e os irmãos foram passar uma temporada no Líbano — terra natal de seu pai, Kazem —, de onde só retornaram quando ela já tinha 19 anos. Graças a esse período em que esteve fora do Brasil, estudando em uma escola de doutrina francesa, Feize era fluente em três idiomas: árabe, português e francês.

Era uma pessoa muito generosa e sempre preocupada com o bem-estar de seus familiares, amigos e até desconhecidos. Tinha uma alma essencialmente materna e foi mãe de quatro filhos: Wallace, Wagner, Wallid e Yussef. “O Yussef é sobrinho, mas ela o criou desde 1 ano e 2 meses de vida; ela dizia que era o caçula dela”, conta o filho Wallace. "Netas são duas: a Maria Eduarda, que é filha do Wagner e a Isabelle, filha do Wallid". E acrescenta: “Ela criou quase todos os sobrinhos, cinco no total: Kazem e Hassana, que são filhos do seu irmão Jamal — já falecido; Samira, Samya e Yussef, filhos do seu irmão Saléh”. O único que ainda estava com ela era o Yussef, todos os outros ganharam seu rumo na vida”.

Ao falar do amor e da dedicação da mãe, o filho se recorda da roseira, que era seu xodó na casa, e que batizou de DudaBella, em homenagem as netas.

Saudoso, Wallace relembra os ditos populares que a mãe citava no seu dia a dia: "Na porta da minha casa, tem um pé de 'cá-te-espero'". "Rumo do feio é por onde veio". "Quem tem como me pagar, não me deve nada”.

No Amazonas, precisamente em Parintins, existe uma festa popular intitulada Festival Folclórico de Parintins. Nesse festival, reconhecido pelo IPHAN como Patrimônio Cultural do Brasil, existe a disputa entre dois bois folclóricos: o Boi Garantido, de cor vermelha, e o Boi Caprichoso, de cor azul. “Nós somos da família do Boi Caprichoso. Dentro da brincadeira do boi-bumbá existe um item de julgamento, chamado 'galera', que se refere à torcida e que conta pontos. A torcida organizada do Caprichoso, a Força Azul e Branca (FAB), surgiu em Manaus porque minha mãe abraçou o projeto. Foi falar com as pessoas responsáveis que poderia dar o aval para que a torcida pudesse nascer em Manaus. A proposta foi aceita devido à sua determinação e força de vontade — isso no início de 1997”. E acrescenta: “Todos os anos passavam pela FAB uns quinhentos jovens, durante um ano, e minha mãe ficou conhecida entre eles como mãezona, a mãe protetora dos componentes dessa torcida. Ela foi homenageada pelo boi-bumbá Caprichoso em uma das 'lives'”.

Feize vivia cercada de pessoas que a recebiam de forma acolhedora, o que demonstra que o seu dom de mãe foi muito além do que ela poderia imaginar.

O filho faz uma última homenagem à sua amada mãe: “Ela era cheia de vida, amava se cuidar, cuidar dos filhos, sobrinhos e netos, e ainda sobrava tempo pra ajudar a quem mais precisava. Amiga fiel, sempre estava a disposição para quem a procurasse. Gostava de dançar, ouvir música e passear. Sua última vontade foi realizada: passear na Região Nordeste do país e se banhar no mar novamente. Minha mãe deixa um imenso vazio em nossos corações, que o tempo vai amenizar, mas nunca vai curar”.

Feize deixou um legado de amor, admiração, coragem e muita alegria. A dedicação à família, à torcida do Boi Caprichoso e sua maneira leve de levar a vida foram as maiores lições que ela deixou.

Feize nasceu em Manaus (AM) e faleceu em Manaus (AM), aos 65 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelo filho de Feize, Wallace Roberto El Kebbe de Almeida. Este tributo foi apurado por Thyago Soares, editado por Thalita Ferreira Campos, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 15 de agosto de 2021.