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Fernando de Souza Lima

1950 - 2020

Desenhava mapas como ninguém e como uma enciclopédia, conhecia cada município à beira do Rio Amazonas.

Fernando era o segundo dos quatro filhos de Seu José Neto e Dona Noêmia. Carinhosamente chamado de Mano, ele era o pilar da família. Sempre muito atencioso e divertido, gostava de fazer zoeiras com as irmãs, Inês e Doca, e de contar histórias em companhia de Carlos e Cézar. Era um grande amigo do seu primo, Cláudio, e um verdadeiro irmão também para seus cunhados.

Era o marido da Walda, com quem viveu por quarenta e três anos, e pai de Fabiana, Flávia e Fábia. Com muita dedicação, nunca lhes deixou faltar nada. Foi avô de Fernando Neto, Fabrício, Eva, e da pequena Aurora Fernanda, que ele não chegou a conhecer. Fernando tinha um jeitão fechado e era generoso: seu coração vivia aberto como as portas de sua casa, onde acolheu muitas pessoas sem se importar se ficariam um dia, dois meses ou quatro anos... Ele acolhia as amigas das filhas, da esposa, de qualquer pessoa. Recebeu e cuidou por um tempo de uma sobrinha como se fosse filha, e em sua mesa nunca faltava acolhimento e um prato a mais se fosse preciso. Não havia quem não gostasse dele.

É Fábia quem fala, carinhosamente, sobre ele: “Papai não era de falar sobre suas emoções, mas as atitudes dele mostravam o quanto ele nos amava. Nos detalhes ele colocava sempre que éramos prioridade. Papai era um tio, primo, cunhado, genro, sogro, avô, amigo, esposo, pai, irmão pra valer. Ele nunca deixou de amar, do seu jeitinho, cada pessoa que esteve na vida dele. Ele sempre foi um paizão. Temos inúmeras recordações do nosso pai. Amávamos ir à feira comer pastel com refrigerante aos sábados e, às vezes, o visitávamos no trabalho dele — era uma diversão”.

Fernando foi funcionário do IBGE durante quarenta e três anos. Amava o seu trabalho porque este lhe permitia viajar muito e conhecer todos os municípios e cantinhos do Estado, e cada milímetro do gigantesco Rio Amazonas. Ele amava lembrar o passado, contar histórias da sua infância e adolescência, e também de tirar gargalhadas das pessoas com as histórias e causos que contava, compartilhando o conhecimento acumulado. Não havia uma pessoa que se sentasse perto dele e não ouvisse pelo menos uma das suas experiências de viagem. No trabalho: os mais novos o procuravam e ele, que gostava de servir e ser útil, compartilhava conhecimentos que trazia de memória.

Aos 50 anos resolveu fazer Geografia, porque queria aposentar-se com um curso superior. E lá se foi para essa aventura, que durou quatro anos de estudos! Era o mais experiente da turma e respeitado por todos. Com a gentileza, que era sua marca registrada, tornou-se um exemplo para muitos, saindo do trabalho todos os dias e indo direto para a faculdade. Quando se formou, aos 55 anos, convidou a filha Fábia para ser sua madrinha e ela se sentiu muito honrada com o convite.

Fernando era um homem do bem, que alegrava qualquer lugar. Gostava de assar o seu peixe aos domingos e de tomar uma cervejinha com os amigos, com a família e, principalmente, com a esposa Walda. Gostava de festas! A família tinha a tradicional “Banda do Nando”, que depois virou “Banda do Nando e Netos”, com a qual festejavam todos os carnavais. Torcia pelo Flamengo, o time do coração e, ultimamente, viciado em caça-palavras, passava horas em sua cadeira de balanço entretido com essa atividade.

Emocionada, Fábia relata: “Meu pai era meu herói. Não tinha uma pessoa que o conhecesse e não gostasse dele. Era minha base e minha maior referência de amor. Quando ele se foi, eu estava com 38 semanas de gestação. Estava feliz com o nascimento da minha filha; mas, ao mesmo tempo, chorava a dor de não o ter mais perto de mim. Minha filha iria se chamar somente Aurora; mas, em homenagem ao avô, chama-se Aurora Fernanda. Estamos seguindo, cada um procurando apoio no que faz sentido à vida. Hoje, quando vejo uma cadeira de balanço, ou quando vejo uma palavra cruzada, vejo a marca registrada dele. Meu pai foi muito amado"!

Fernando nasceu em Manaus (AM) e faleceu em Manaus (AM), aos 70 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Fernando, Fábia da Silva Lima. Este tributo foi apurado por Rafaella Moura Teixeira, editado por Vera Dias, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Ana Macarini em 14 de março de 2022.