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Francisca Cionilde Andrade Carneiro

1948 - 2020

Para além da profissão que amava, o amor maior de Francisca era mesmo por sua família.

Francisca nasceu e viveu na praia de Almofala, distrito da pacata cidade de Itarema, no Ceará. Seu pai era pescador e sua conexão com o mar permaneceu a vida toda. Nos finais de tarde costumava passear pela orla, pisando na areia e observando a paisagem que ainda hoje remete aos cartões postais.

Quando jovem, gostava de costurar e fazia algumas roupas que seu irmão Raimundo levava para vender em Rondônia. Sua mãe morreu cedo, e Francisca ajudou a criar os irmãos mais novos. Com 18 anos, se casou com Pedro Vigoberto Carneiro e teve seis filhos: Maria Irislene, Irisjane, Vanusa, Sérgio, Darlan e Rodney. Hoje possui também treze netos e oito bisnetos.

Seu irmão mais novo, Manoel Messias, que a considerava uma segunda mãe, tornou-se médico e a convidou para trabalhar como técnica de enfermagem. Tamanha foi a paixão de Francisca por essa profissão que depois de criar seus filhos, já com mais de cinquenta anos, decidiu fazer um curso e se diplomou. Trabalhou por um bom tempo no Posto de Saúde e se aposentou em 2011, aos 63 anos.

Vivian, uma de suas netas, conta que mesmo depois de aposentada, a avó ajudava as pessoas doentes e acudia sempre aqueles que precisavam e por isso, tornou-se respeitada e querida na comunidade local.

Compreensiva, sempre intervinha para resolver qualquer conflito com seu jeito calmo e mediador. “Ela não gostava de gritaria, achava que tudo poderia ser resolvido na conversa”, diz Vivian, sua neta. Todos os dias ia na casa dos familiares que moravam todos por perto. Era disso que ela mais gostava, e seu último pedido foi: “Que a família permaneça unida, que todos fiquem juntos”.

Era católica e devota de Nossa Senhora de Fátima. Tinha fé. A neta lembra de um momento muito difícil pelo qual passou e relata que foi a avó quem a incentivou a não desistir e a acreditar em si mesma. Francisca dizia que “Deus não nos dá uma cruz maior do que podemos carregar e tudo serve como crescimento e amadurecimento” rememora. “Ela foi minha incentivadora, o sonho dela era me ver formada”, diz Vivian, que hoje está cursando Engenharia de Pesca.

O casamento de Francisca e Pedro foi um encontro de almas que durou 54 anos. Pedro era um pouco temperamental, mas ouvia e acatava as palavras da esposa. Viveram uma história de companheirismo que é um exemplo para os filhos e os netos. Quando ele foi internado, antes dela e também com Covid-19, Francisca ainda conseguiu falar com o marido no hospital e lá trocaram juras de amor. A evolução rápida da doença a levou em apenas uma semana e doze dias depois, Pedro foi ao seu encontro.

Francisca nasceu em Itarema (CE) e faleceu em Sobral (CE), aos 71 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Francisca, Vivian Carneiro. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Bettina Turner, revisado por Rosana Forner e moderado por Rayane Urani em 4 de junho de 2020.