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Ivanis Andrade de Moraes

1937 - 2020

Gostava de conversar e jogar cartas à sombra da mangueira, no entorno da sua casa.

Com seu cabelinho já todo branco, ela era dona de uma alegria singular, de uma fé inabalável e dos mais sensatos conselhos. Era também a melhor das mães e a mais carinhosa avó do mundo, cheia de vida, extrovertida e amante de bolos e cafés. É assim que Dona Ivanis será sempre lembrada.

Em Bom Jesus de Itabapoana, ela viveu na Vila Vicentina durante muitos anos. E era nesse lugar mágico — marcado pela experiência dos muitos idosos que lá residiam — que ela acolhia todos os familiares e se fazia alegria para os netos e as netas.

Seu sobrenome poderia ser superação. Ivanis contava que nasceu na zona rural, em meio a uma plantação — o mesmo local onde trabalhou por muitos anos, e onde conviveu com a dura rotina dos canaviais. Anos depois, dedicou-se aos afazeres do lar.

Casou-se com seu primeiro e único namorado, Antônio Oliveira. Juntos formaram uma família linda: cinco filhos - Chico, Zezinho, Joana, Antônio Carlos e Geraldo -, doze netos e oito bisnetos. Todo encontro dessa turma era uma grande festa. Os familiares que moravam mais distantes de Bom Jesus tinham um período certo para se integrarem à grande rede de afetos: as férias do final de ano.

Na relação com os netos, tinha uma carta na manga: sua infalível receita de frango a passarinho, o mais saboroso das redondezas. "Eram tantas as bocas, que ela servia a iguaria numa bacia", lembra a neta Jennipher.Tudo servido antes do banho de mangueira, que a criançada tanto amava.

Era uma mulher de fé e de hábitos simples. Devota de Nossa Senhora Aparecida, era telespectadora assídua do canal de TV que leva o nome da Santa. Lá assistia às missas e aos mais variados programas. Também gostava das telenovelas e dos programas de auditório. Era fã do Amado Batista. "Moreninha" era a música que ela mais gostava. Não perdia uma partida de futebol em que o Vasco da Gama estivesse em campo.

Com os filhos, gostava de conversar à sombra da mangueira. Lá ficavam por horas e horas, dialogando. Nesse mesmo lugar, jogava truco com os netos. Advinha quem ganhava todas as rodadas? Ela mesma... Na mesa de jogo ela tinha a fama de “passar a perna” nos netos.

A Vó Ivanis era um tanto metódica. Conta a neta Jennipher que, quando a casa estava cheia, “ela se encarregava de encher a geladeira de garrafinhas de água. Era uma para cada pessoa que estivesse na casa”. O netos Fernanda e Everton dizem sentir saudades disso e dos abraços, dos conselhos e da proteção que ela lhes dava quando faziam travessuras.

Em 2019, aos 82 anos, quis a vida que Ivanis se reinventasse. E assim foi feito. Ela foi morar em Maracanaú, junto ao filho Geraldo, bem longe do lugar onde viveu toda a sua vida. Foi um período bem intenso de mudanças e de muitas descobertas para aquela mulher que, apesar de toda experiência, sempre tinha o que aprender.

Geraldo e a esposa, Eliete, lembram da felicidade da Dona Ivanis vendo o mar pela primeira vez: “Parecia que estávamos vendo uma criança na nossa frente”. O casal afirmou também que “ela era a alegria da nossa casa. Tivemos a sorte de dividir bons momentos com a nossa saudosa Ivone - como gostava de ser chamada”.

Dona de uma sabedoria muito lembrada por todos, Ivone sempre dizia que sem amor a vida não tinha sentido. Era grata pelos encontros que a vida lhe proporcionou e por isso foi tão generosa ao partilhar sem distinção todo carinho que recebeu.

A pequena mulher, se fez grande: retirou todas as pedras que apareceram em seu caminho ao longo da vida — ou delas conseguiu se desviar. Por isso, será sempre inspiração entre aqueles que carregam os pedacinhos de recordação que remontam ao seu legado. Por tudo, e por tanto que fez, Ivanis nunca será um número.

Ivanis nasceu em Bom Jesus do Itabapoana (RJ) e faleceu em Maracanaú (CE), aos 82 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pelo filho, pelos netos e pela nora de Ivanis, filho Geraldo Aparecido Andrade de Moraes, pela nora Eliete e pelos netos (as) Jennipher Fernanda Moraes, Everton Antônio Moraes.. Este texto foi apurado e escrito por Fabrício Nascimento da Cruz, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 18 de outubro de 2021.