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Joana Lemos da Silva

1919 - 2020

Vovó me ensinou a fazer meu primeiro laço, a pular corda, a rezar, a dizer obrigada, e principalmente a respei

“Deus te abençoe”. Essa era a frase que a minha avó mais repetia. Essa serão as palavras eternas que a nossa família guardará no peito. Joana, mais conhecida como vovó Joaninha, era para mim a velhinha mais linda do mundo. Daquelas que a gente tem vontade de botar num potinho e guardar para sempre. Se o seu apelido era no diminutivo, a sua honra e benevolência eram no superlativo. Educação e bondade resumem o olhar da minha avó. Não importa por onde passava, lá estava o seu bom dia, a sua licença, o seu como vai, a sua chuva de beijos com voz mansa e humilde.

Ela conseguia fazer apenas com um sorriso com que todos se sentissem acolhidos. Vovó Joana teve uma vida cheia de percalços. Após o falecimento do meu avô, batalhou para sobreviver e criar os filhos. Embora fosse delicada, tinha força para a luta. A sua casa, sempre aberta para família, virava santuário aos domingos. Ao seu redor, ríamos e contávamos histórias engraçadas. Vovó me ensinou a fazer meu primeiro laço, a pular corda, a rezar, a dizer obrigada, e principalmente a respeitar todos acima de tudo. Sempre sentada eu seu terraço, olhava para fora com olhar de espera. Felicidade era ver alguém da família chegar, ou algum conhecido passar.

Poucos dias antes de partir ela falou que Maria estava vindo buscar. Isso foi no dia de Nossa Senhora de Fátima, cuja devoção era grande.

A Covid nos tirou nossos últimos minutos a seu lado. Tirou nossa mão segurando a dela em um momento de coragem final e um velório com pessoas queridas para a última despedida.

Agora ela descansa sob o manto de Maria, e tenho certeza de que fará muito por nós lá de cima.

Vovó, que Deus te abençoe.

Amém.

Sua neta, Jéssica Lemos

Joana nasceu em Bezerros (PE) e faleceu em Recife (PE), aos 100 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Joana, Jéssica Lemos. Este texto foi apurado e escrito por Martha Batalha, revisado por voluntário e moderado por Rayane Urani em 16 de junho de 2020.