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João Gonçalo da Silva

1954 - 2020

Tornou-se um especialista em estrutura de obras; quando surgia um problema no hospital, João era chamado para resolver.

Natural de um pequenino município do interior paraibano, ele enfrentou, com coragem e resiliência, o caminho mais difícil. Quando contava apenas 5 anos, o pai abandonou sua mãe com os 14 filhos. Não havia atalhos. Era preciso sobreviver ou sobreviver. Assim, aos 7 anos, João já trabalhava no roçado.

Na Zona Rural, também conheceu seu primeiro e único amor: Maria de Fátima. "Meu avô materno tinha plantação perto de onde meu pai ia capinar e eles acabaram se encontrando", explica Neykson, um dos filhos do casal.

Tinha cerca de 19 anos quando resolveu buscar melhor destino na cidade do Rio de Janeiro. Foi lá que João aprendeu o ofício que lhe deu sustento digno e felicidade: pedreiro. "Depois que chegou ao Sudeste, a situação financeira dele começou a melhorar", conta Neykson.

Anos mais tarde, retornou à Paraíba e passou a morar na capital. "Meu pai amava a sua profissão! Trabalhou no Hospital Público da Polícia Militar General Edson Ramalho, como Mestre de Obras, por mais de vinte anos, e conhecia as instalações como ninguém.

João foi, inclusive, convidado a assumir a Gerência do Setor de Manutenção. Recusou o posto, contudo se tornou uma espécie de consultor para solucionar os problemas estruturais que apareciam no hospital. "Por isso, mesmo afastado, ele era chamado em casos de emergência, para dar conta do problema" relembra o filho.

Nessa época, ele ganhou o apelido de um dos sargentos que circulava pelo Hospital: Pereirinha. "Ninguém sabe o porquê, contudo pegou.", diz Neykson, que teve o privilégio de iniciar sua vida profissional com o pai na mesma Instituição: "Eu era ajudante dele nas obras do Hospital. Mais tarde, enveredei pelo mundo da informática e hoje sou Gestor em Tecnologia da Informação. Tudo graças a ele, que nunca quis que eu trabalhasse em obras. Tanto que não sei colocar um tijolo sequer", ressalta.

Marido amoroso por quarenta e três anos e pai dedicadíssimo, vivenciou duros percalços no último ano de sua vida, com a perda da única neta e do filho caçula.

"Papai sempre foi muito atencioso, não apenas comigo, mas também com meus outros dois irmãos. Quando resolvi comprar outro apartamento, conversamos e ele sugeriu que eu construísse um primeiro andar na casa dele, pois ele dizia que estava se aposentando e me queria por perto".

Ao lado de sua esposa, filhos e neta, teve seus dias mais felizes e realizados. Quando o casal era jovem, costumava aproveitar as festas do interior: São João, quermesses e forrós. Com os filhos pequenos, João costumava levá-los em passeios de moto na Turuna que comprou de um amigo. A família também curtia ir para a praia aos domingos. Já mais idosos, Maria de Fátima e o marido preferiam jogar cartas com os amigos da vizinhança.

"Meu pai era o meu apoio. Partiu muito jovem, mas com a certeza de que nos deixou bem criados; fez o papel dele. Agora, está construindo obras ao lado de Deus. Obrigado, papai!

João nasceu em Duas Estradas (PB) e faleceu em João Pessoa (PB), aos 65 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelo filho de João, Neykson Hares da Silva. Este tributo foi apurado por Talita Camargos, editado por Luciana Assunção, revisado por Magaly A. da Silva Martins e Maria Eugênia L. Summa e moderado por Ana Macarini em 29 de dezembro de 2021.