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João Miguel de Oliveira

1953 - 2021

Carpinteiro gentil que construiu os brinquedos da infância do filho.

Ele era um tipo único de pessoa. João Miguel de Oliveira até parecia meio fechado, mas se comunicava e demonstrava carinho através de gestos. Quando gostava de alguém, tentava agradar de todas as formas para deixar o outro confortável. Se a pessoa não gostava de refrigerante, por exemplo, ele comprava um suco. Ou uma água. Ou uma cerveja.

O carpinteiro teve uma infância e adolescência difíceis, mas contornou esses problemas se tornando um ser humano disponível para todas as necessidades, seja da família ou dos colegas de trabalho. Muitas vezes esquecia de pensar nele, para pensar no próximo. Os colegas, inclusive, descreviam-no como uma pessoa brincalhona e sempre disposta, que costumava trazer conforto para as outras pessoas. O filho de João Miguel, Jovane de Oliveira, lembra: “para ele não tinha tempo ruim. Tudo o que eu aprendi sobre pensar no outro e querer ajudar o próximo, teve o importante papel dele”.

Natural da serra no Rio Grande do Sul, João morou em diferentes locais, mas só firmou território em São Leopoldo, no mesmo Estado, por causa da mãe. O carpinteiro acabou conectando-se com a cidade, e seus irmãos também foram morar lá.

João Miguel tinha um grande apreço por carros e se sentia satisfeito toda vez que conseguia trocar de automóvel. Mas essas conquistas materiais nunca chegaram nem perto daquela que ele mais almejou: ter um filho com sua esposa, Nevolanda de Oliveira. Ela, que engravidou aos 40 anos, gerou Jovane.

“Todos os meus tios e tias sempre falam que meu pai não deixava ninguém chegar perto de mim. Não deixava ninguém trocar minhas fraldas, não deixava ninguém me cuidar além dele. Ele era muito apegado”, conta o estudante de Psicologia.

No seu tempo livre, João também gostava de continuar trabalhando com a madeira. Estudou apenas até a quinta série e filmes e séries não o prendiam. No entanto, amava construir coisas. Durante a infância de Jovane, fez os brinquedos do filho: carrinho de lomba, cestas de basquete e pernas de pau.

Como todo gaúcho, sua rotina de domingo incluía fazer seu churrasco, tomar cerveja e ficar tranquilo na sua, aproveitando os momentos com a família. Aposentado, fazia planos de viajar para praias e aproveitar o tempo livre com Dona Nevolanda.

João nasceu em Canela (RS) e faleceu em São Leopoldo (RS), aos 68 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pelo filho de João, Jovane de Oliveira. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Ângelo Gabriel da Silva Santos, revisado por Emerson Luiz Xavier e moderado por Rayane Urani em 2 de maio de 2021.