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Jorge Matos da Silva

1948 - 2021

Escolheu trabalhar na garagem de casa, só para poder cuidar dos filhos.

Feche os olhos e tente imaginar uma pessoa doce, caridosa, prestativa, brincalhona e que transbordava serenidade. Adicione a essa história, ela ter escolhido trabalhar na garagem de casa para cuidar dos filhos. Não satisfeita totalmente, inclua saber preparar a mesa do café com todo carinho do mundo, cozinhar os pratos mais deliciosos, levar e buscar na escola, ir às reuniões pedagógicas, fazer tranças, dar banho e ensinar os filhos a dançar.

Pode abrir os olhos agora! Qual imagem essa descrição trouxe a você? Vou dizer: a figura maravilhosa descrita, atendia pelo nome de Jorge! Um pai e avô dedicado, amoroso e trabalhador.

Sua especialidade era a estamparia. Não só das roupas e afins, que ele caprichava como ninguém. Mas da própria vida. A felicidade estava sempre estampada em seu sorriso. Ele era tão feliz e autêntico! Estava sempre mimando os filhos e netos. Era um sorvete aqui, um chocolatinho ali... Inventava até apelidos e músicas para a família. As suas filhas, Carol e Herica, por exemplo, eram as “Jorjocas”.

Sabe aquela pessoa que esconde as travessuras dos filhos, que conserta e pinta os vasos quebrados para eles não levarem broncas, que leva e espera no carro seus filhos adolescentes para que possam aproveitar a noitada, ou os espera acordado até altas horas? Ou então, aquela pessoa que faz amizade com os namorados das filhas e depois sofre quando há separação? Imagino que agora, depois de ser devidamente apresentado, você pensou em Jorge. Pois bem, você acertou em cheio!

Se alguma coisa precisasse de conserto, bastava entregar a ele. Estava sempre pronto a ajudar, não importando em quê. Uma vez até levou a vizinha à maternidade para trazer seu bebê ao mundo.

Jorge era um homem de fé inabalável. Kardecista praticante e médium responsável, não media o tempo para ajudar as pessoas. Aliás, esse bem tão precioso, o tempo, era dedicado de corpo, coração e alma ao próximo.

Para se distrair, amava assistir a jogos de futebol; era o único vascaíno da família. Também era grande apreciador das novelas e filmes de faroeste.

Jorge era um cara distraído e esquecido. Daqueles que nunca se lembram do local onde deixou as chaves. Talvez para ele, fosse, na verdade, um motivo de diversão, já que filhos e netos o ajudavam na empreitada de encontrá-las.

E não havia nada nesse mundo mais valioso para ele do que uma casa cheia. Cheia de amor, cheia de gente, cheia de riso e cheia de vida.

Jorge nasceu no Rio de Janeiro (RJ) e faleceu no Rio de Janeiro (RJ), aos 72 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Jorge, Herica Matos da Silva. Este tributo foi apurado por Giovana da Silva Menas Mühl, editado por Ricardo Valverde, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Rayane Urani em 17 de agosto de 2021.