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José Aleixo Gaspar

1940 - 2021

Ele mesmo colhia da horta os temperos para preparar as comidas de final de ano; apenas uma desculpa para reunir a família.

Nascido no interior de São Paulo, aos 6 anos José Aleixo mudou-se para o Paraná quando o pai foi trabalhar em um sítio, próximo à cidade de Maringá, onde se estabeleceu como pioneiro e um dos primeiros moradores.

Casado com Elisabete Conceição, veio a falecer cinco meses antes de completarem sessenta anos de casados. Ambos nasceram no estado de São Paulo, mas conheceram-se em Maringá. Como marido ele foi um exemplo de atenção e amorosidade.

Dessa união vieram os filhos Carlos Antônio, Sandro, Paulo e Patrícia. De acordo com os costumes da época, José era rígido e mal falava com os filhos. Com o tempo ele foi se modificando, até que seu coração acabou por se amolecer totalmente com a chegada dos cinco netos. Com eles José tornou-se afetuoso, cuidadoso e paciente, conforme conta a neta Marina: “Meu avô foi o único que teve paciência de me ensinar a tabuada e guardo essa lembrança com muito carinho. Ele quem me levou para tirar o título de eleitor, ele quem ia à feira fazer as compras da semana e sempre voltava com o queijinho e com a pamonha que eu e minha irmã gostávamos”.

José gostava de reunir a família sempre que surgia uma oportunidade. Qualquer peixe pescado ou bacalhau comprado, era motivo para organizar um almoço e convidar todos os filhos e netos. Quando chegava o Natal era ele quem pensava no cardápio e organizava a lista de compras. No momento certo, ia até a horta do condomínio, colhia, higienizava e cortava os temperos, deixando-os prontos na geladeira para a hora em que ele mesmo fosse cozinhá-los, como gostava de fazer nos eventos de família.

E assim, de evento em evento, era ele quem promovia a união familiar, como conta Marina: “Meu avô era a pessoa mais importante da nossa família. Ele era a cola que juntava os irmãos e os filhos. Aqueles foram alguns dos momentos mais importantes da minha vida. Ele adorava contar piadas e conversar. Brincávamos que ele era o 'homem da cobra', porque não parava de conversar um segundo sequer”.

Fervoroso, sempre muito devoto de Nossa Senhora, rezava todos os dias de manhã. Atuante na comunidade, ajudou a fundar a Associação Maringaense de Saúde Mental – AMSM, depois que um de seus filhos foi diagnosticado com um distúrbio de saúde mental, para poder entender mais sobre o diagnóstico do filho e ajudá-lo.

Sua vida profissional foi bastante diversificada. Começou como engraxate e vendedor de frutas, ainda criança, para auxiliar no sustento da família. Posteriormente, trabalhou em uma quitanda fazendo doces e picolés. Depois, passou a operador de caixa e chegou a ser promovido para trabalhar na contabilidade, mesmo não tendo terminado sequer o ensino fundamental.

Dedicado, fez o curso supletivo e, anos mais tarde, ainda antes de se aposentar, descobriu sua vocação como corretor de imóveis. Foi assim que o Seu Gaspar acabou conhecendo metade da cidade de Maringá.

Ele era muito caprichoso e sempre se prontificava a ajudar as pessoas. Metódico e prestativo, estava sempre disposto a ajudar os outros, mesmo que somente com palavras ou com um abraço. Colocava-se à frente das construções e das mudanças de todos os filhos.

Acordava mais cedo todos os dias só para fazer café para a filha, conforme relata a neta Marina: "Minha mãe nunca foi para o trabalho sem antes tomar um café que meu vô tinha feito. Quando eu, meu pai, minha mãe e meus irmãos nos mudamos para a mesma cidade, meu avô fez questão de cuidar da mudança. Ele quem cuidou da instalação das luzes, das maçanetas e da pintura do apartamento, pois meu irmão era recém-nascido e meus pais não conseguiriam cuidar da reforma sozinhos”.

Nas horas vagas, José adorava fazer palavras-cruzadas: qualquer momento livre durante o dia, lá estava ele deitado na cama completando o seu livrinho. Fora isso, gostava também de fazer sauna e frequentava regularmente um clube na cidade, onde fez muitos amigos, com os quais se reunia toda quinta-feira para fazerem um jantar.

Marina chega a ter dificuldade para selecionar histórias significativas que viveu com o avô, mas relembra uma delas na homenagem que faz a ele: “Não é bem uma história marcante, mas eu me lembro que meu vô sempre chupava laranja depois do almoço. E ele sempre descascava laranjas para todo mundo, ele quem me ensinou a descansar laranja, inclusive. Lembro que um dia fui tentar descascar uma delas no Restaurante Universitário da minha faculdade e só consegui quando me lembrei de como ele havia me ensinado. Também lembro do meu avô sempre que ouço "Nossa Senhora do Brasil", interpretada pelo padre Marcelo Rossi".

Ela continua: “Meu avô nos ensinou valores de honestidade, humildade e de boa comunhão com as pessoas. A educação que eu recebi do meu pai era exatamente como meu avô havia ensinado para ele. O maior sonho do meu avô era construir uma casa perto do Rio Paraná e graças a Deus ele pôde realizar esse sonho.

E conclui dizendo: “Lembraremos dele como um sujeito muito comunicativo, animado, falante e carinhoso. O maior exemplo de postura e comportamento que nós poderíamos ter. Todos os seus feitos serão lembrados e passados adiante com o maior orgulho, com toda certeza".

José nasceu em Cedral (SP) e faleceu em Maringá (PR), aos 80 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela neta de José, Marina Freitas Gaspar. Este tributo foi apurado por Andressa Vieira, editado por Vera Dias, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Ana Macarini em 23 de julho de 2023.