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José Carlos Moniz Fernandes

1964 - 2021

Investigou o gosto musical de cada colega de trabalho para montar a playlist do Réveillon; sonhava em ser DJ.

Quando menino, tinha os cabelos de anjinho, os olhos azuis pareciam gotas do oceano. Encantador. Desde muito jovem conquistou a todos com seu jeito alegre e engraçado. Certa vez, ganhou uma bicicleta de um tio que economizava tudo o que ganhava. O presente veio de um homem fechado, um português bastante reservado, mas José Carlos aqueceu o espírito do tio. Além da bicicleta, ele deu outros mimos ao sobrinho. Foi um filho maravilhoso. Cuidou dos pais incansavelmente. A mãe faleceu em 2019, após anos com Alzeihmer. Acompanhou o pai no tratamento de câncer de próstata até o final, início de 2020.

José Carlos tinha um jeito simples de viver e uma forma peculiar de cumprimentar, colocava apelidos carinhosos em todos. Era contestador, mas sempre de forma educada, o que agradava até os mais velhos. Não gostava muito da escola. Já a escola, incluindo os professores, gostavam dele. Era um amigo fiel e presente, se relacionava bem com todos. Alimentava um forte interesse por tecnologia e pelas novidades do mundo, preferências que dividia com o único filho, Leandro. Nunca buscava ser o centro das atenções, mas estava sempre fazendo as coisas acontecerem. Amava futebol; era torcedor do Flamengo, seu time de coração.

Desfrutou de 38 anos de convivência ao lado do amor de sua vida, a mulher e mãe de seu filho, Solange. Os jovens - à época -, se conheceram na Primavera de 1983, e, ao primeiro sinal de troca de olhares, já estavam apaixonados. Depois de cinco anos, casaram-se. Um ano após a união, nasceu Leandro, um canceriano amoroso, dedicado aos pais. Cuidou de José Carlos quando contraiu covid e se infectou logo depois, mas omitiu para não preocupar ninguém.

Solange lembra que as primeiras bodas não foram fáceis. Afinal, eram um casal de taurinos típicos. Porém, tudo ficou mais simples rápido. "Quanto mais o tempo passava, mais sabíamos, só pelas trocas de olhares o que estávamos pensando. Parecia haver uma continuidade. As tempestades passavam logo, e, como o amor reinava, ele ficava", afirma Solange.

José Carlos também aprendeu dizer "eu te amo" com Solange. Tinha vergonha no início, foram as brincadeiras insistentes da esposa que tornaram natural ele declarar seus sentimentos. Entre as fotos que ele enviava, sempre com data, mandava "Eu te amo" com frequência. Pessoalmente, a frase também saía com facilidade de seus lábios. "Me lembro de tantas brincadeiras 'bobas' que surgiam enquanto esperávamos o jantar. Uma simples caneta virava um desafio. E o que dizer da sua paciência... não experimentei o seu limite.", relembra.

Em janeiro de 2021, ele estava radiante diante da possibilidade de se aposentar. Havia dado entrada na aposentadoria após 25 anos dedicados a uma empresa. Fazia planos de ser DJ quando se aposentasse. Em uma festa de final de ano da empresa, descobriu o gosto musical de cada colega para montar a lista de músicas que alegrariam a festividade.

Deixou muitas saudades, nunca maiores do que o amor que que ficou entre aqueles que conheceu.

José nasceu em São Paulo (SP) e faleceu em São Paulo (SP), aos 56 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela esposa de José, Solange Moreira Vilella Moniz Fernandes. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Talita Camargos, revisado por Claiane Lamperth e moderado por Ana Macarini em 2 de dezembro de 2021.