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José Marcos de Araújo Manasfi

1961 - 2020

Pontualidade e violonista de samba eram suas características.

Esta é uma carta que Ernesto escreveu para seu amigo, José Marcos:

Meu vizinho desde que me entendo por gente, desde os idos do final dos anos 1960, na Rua Gonçalves Dias, no centro de Porto Velho, Rondônia.

Mais novo que eu dez anos. Sua amizade, a princípio, foi com os meus irmãos Enos e Ênio Melo, contemporâneos; depois, já era amigo de todos da rua: Basinho, Elsedir, Binho, Men, Hélio e tantos outros.

A gente o chamava só de "Rato". Rato porque, quando criança (começo dos anos 1970), a Prefeitura estava colocando as manilhas para instalar o sistema de esgotos da rua. Era uma ladeira até considerável. Quando chovia, a água descia torrencialmente ladeira abaixo, agora já pelas manilhas colocadas aqui e acolá, e o pequeno (sempre foi menor que os amigos, mas forte) Marcos descia manilha abaixo, a favor da água, até o pé da ladeira, e se orgulhava de ser o Rato de Esgoto, se bem que era água limpinha, mas pegou: "Rato de Esgoto", e depois ficou só "Rato", o amigo Rato, querido e amado por todos.

Cresceram todos juntos, prestou vestibular para Engenharia em Manaus, segundo o meu irmão (todos estavam lá) ele era o que mais tinha chances de passar. Não deu: ia muito bem, mas tomou um porre e perdeu a última prova. A vida continuou, Rato aprendeu a tocar violão com o Ênio e, desde então, era o nosso violonista de samba ao lado do Ênio. Só fez amigos, no Areal e em outros bairros da periferia.

Rato, Rato, Rato. E agora? E agora, José? A festa acabou, a luz apagou e tudo foi embora. O que será de nós sem a sua pontualidade capaz de envergonhar qualquer inglês?

Demoravas para chegar, mas chegavas, pois o samba tinha que começar. Estou pedindo ao bom Deus que me acorde, que eu esteja apenas dormindo, cansado de te esperar pro samba começar, e de repente tu chegas, com aquele sorriso largo se justificando: "Desculpe, só passei na casa da Jamily. Vamos?"

José nasceu em Porto Velho (RO) e faleceu em Porto Velho (RO), aos 59 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelo amigo de José, Ernesto Oliveira Bento de Melo. Este tributo foi apurado por Malu Marinho, editado por Mateus Teixeira, revisado por Paola Mariz e moderado por Rayane Urani em 26 de novembro de 2020.