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José Simplício de Melo

1932 - 2020

Um homem apaixonado pelo campo. Viveu para o trabalho, mas sem abdicar do tempo para a esposa e os filhos.

Nascido em família pobre do interior do Rio Grande do Norte, Zé Pial, como era chamado, cresceu ajudando o pai, e, assim como ele, tornou-se um marchante, um vendedor de carne nas feiras livres.

Com a cultura do trabalho tão entranhada desde cedo, Zé Pial passou a juventude trabalhando, mas quis o destino que ele tirasse folga para conhecer uma certa jovem de cabelos longos.

Os dois eram da mesma idade e, ainda que ela não estive à altura dele, o baixinho moreno não se intimidou diante daquela mulher alguns centímetros mais alta. Tratou logo de fazer dona Neuza se apaixonar por ele também. Conclusão: deu casamento.

Aí vieram os filhos: quatro homens e três mulheres. Zé Pial fez seu nome na profissão e comprou um sítio, onde alimentar e ordenhar as vacas, e colher as frutas, por ele mesmo plantadas, eram o que mais amava fazer por lá.

Chegou um momento em que três dos meninos seguiram o caminho do pai, literalmente. Juntos eles iam e voltavam das feiras livres, porém cada um vendia sua mercadoria na própria barraca.

Desse modo, o marchante foi tocando a vida, trabalhava sem parar nas suas terras e acordava ansioso para montar a banca de produtos, pois sempre primou pela liberdade financeira. Ao cair da tarde, Zé Pial retornava para o amor da esposa e dos filhos. Em casa, ele e dona Neuza passavam as horas conversando, assistindo televisão ou deitados lado a lado.

A neta Jéssica relembra o avô como um homem amoroso, muito simples, extremamente honesto e trabalhador.

Com o passar do tempo, a rotina de trabalho ficou comprometida pelos problemas de saúde, então, Zé Pial precisou abandonar a lida. Passou a viver apenas da aposentadoria e seus dias transcorriam dentro de casa, na companhia da esposa e das duas filhas que ainda moravam com o casal.

Jéssica conta que o marchante nunca se esqueceu das suas terras, nem na fase avançada do Alzheimer. "Se pudesse, estaria lá todos os dias, zelando de cada centímetro, cuidando do gado", ela diz, e resume em dois, os sonhos de Zé Pial: “os filhos viverem em paz e harmonia e também cuidarem e amarem o sítio tanto quanto ele amava.”

Outra lembrança marcante para a neta é a imagem do avô cochilando na cadeira de balanço, com os dedos indicadores tocando o nariz, como se estivesse meditando... Vai ver ele estava!

José nasceu em Açu (RN) e faleceu em Pau dos Ferros (RN), aos 88 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela neta de José, Jéssica Paula Simplício. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Mariana Quartucci, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 26 de outubro de 2020.