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Josefa Darci de Assis

1940 - 2020

Nasceu em dia de feira, amava o carnaval, passava roupas ouvindo música e jamais saía sem perfume.

Essa paraibana valente e cheia de brilhos nem nasceu, ela estreou num dia 11 de setembro; era bem um dia de feira no bairro. Aquela barulheira característica, os vendedores gritando seus bordões, burburinho de gente, baguncinha boa. Do jeitinho que ela gostava! E o dia de sua partida não podia ser diferente, Darcinha cerrou as cortinas do palco de uma vida iluminada num belíssimo 24 de junho. Sim, senhor! Em pleno Dia de São João, um dia importantíssimo para qualquer nordestino.

Darcinha saiu da Paraíba ainda criança, sua família migrou para Natal; ela, o pai, a mãe e mais cinco irmãos. Em Natal conheceu Cícero de Assis, namoraram, casaram-se, e dessa união nasceram cinco filhos biológicos, mais um adotivo, além de uma neta que foi registrada e criada como filha ─ todos abençoados pelos pais. Cada um recebeu, ao longo da vida, a melhor herança que se pode receber dos pais: um legado de muita coragem e alegria de viver.

Tinha inúmeras paixões, era extremamente habilidosa, amava o artesanato e também levava muito jeito para o comércio; talvez fosse por sua facilidade em encantar as pessoas com seu jeito brejeiro e brincalhão; era impossível não se encantar por ela.

A família era tudo para Darcinha, o esposo amado recebia todo seu afeto e atenção; os filhos ─ todos eles ─, tinham o colo de mainha, mas também a orientação firme necessária para seguir bons caminhos na vida; e os sogros eram cuidados com todo zelo. Quando mais jovem, Cícero Assis trabalhava como civil na Marinha e Darcinha caminhava 40 quilômetros para levar mantimentos na casa dos pais de seu marido.

Dona de uma fé inquebrantável, era devota de Nossa Senhora Aparecida. Costumava ter longas conversas com a santinha e podia jurar que era ouvida, e respondida. Jamais perdeu a esperança ou a alegria de viver, mesmo que estivesse passando pelas maiores dificuldades, nunca se entregou à tristeza; enfrentava tudo de queixo erguido e com o coração recheado de confiança na bondade do Pai.

Nas horas de folga, ela se punha a passar roupas. Isso mesmo, passar roupas, pois há quem diga que essa tarefa doméstica tão enfadonha para uns, funciona como uma verdadeira técnica de meditação para outros. Pois, assim era para nossa formosa paraibana. Só que Darcinha não passava roupas em silêncio, não. Punha para tocar Zezo, no volume máximo; e tanto podia ser um xote, uma seresta ou um forrozinho, ela gostava de todas.

Nos carnavais a sua de casa de praia era a mais enfeitada e não podia ver os bloquinhos de rua que ela saía atrás. Depois, o filho tinha que sair para procurar em todos os blocos a danadinha e trazê-la de volta para casa.

As roupas que ela gostava de usar estavam longe de ser comuns; eram brilhosas, estampadas, os sapatos eram dourados, os dedos cheios de anéis; nas orelhas, brincos grandes e só usava perfumes ativos. Essa era sua produção cotidiana. Ela era muito feliz!

Ninguém duvida que a estrela Dalva, que no céu desponta, deve andar até meio ofuscada ultimamente. O céu ganhou uma estrela de brilho inigualável: Darci foi iluminar o firmamento! Há de ter carnaval todo dia, há de ter um bom forró e não há de faltar alegria a quem chegar para estar junto dela na casa do Pai.

Josefa nasceu em Cuité (PB) e faleceu em Natal (RN), aos 80 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pelo filho de Josefa, Cicero de Assis Junior. Este texto foi apurado e escrito por jornalista , revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 26 de novembro de 2020.