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Jurandy Pessuto

1942 - 2021

Prezava por manter a família unida, fosse em volta da mesa para um nhoque ou nas férias na praia em Ubatuba.

Nascido numa família de sete filhos, Jurandy cresceu vendo os pais, de origem italiana, cultivarem café nos campos do interior paulista. A criação de costumes rígidos levou-o ao trabalho ainda na adolescência, em Fernandópolis. A primeira conquista veio logo em seguida, com a compra do tão sonhado carro.

Da janela do escritório onde atuava como contador admirava a mocinha que diariamente por ali passava no retorno da escola. Os olhares furtivos renderam um longo e fiel romance. Jurandy não perdeu tempo para se aproximar de Edna e propor o namoro. Do primeiro beijo ao enlace do matrimônio passaram-se dois anos, que, depois, se somaram aos cinquenta e seis em que o casal conviveu “com muita compreensão, carinho e amor, um ajudando ao outro para constituir a família”, declara a esposa. Trocaram as alianças em plena juventude. Ele aos 23, ela com 18.

Com o nascimento de Adriane, a primogênita, Jurandy resolveu perseguir o sonho de se tornar advogado. Enquanto ele cursava Direito na mineira Uberlândia, Edna empenhava-se nos cuidados dos filhos que foram gestados ao longo do tempo: Andréa, Edivânia e Jurandy. O caçula chegou juntamente com o diploma do pai. O rigor que pregou na educação, especialmente das filhas, com horários determinados para chegar em casa e os ciúmes pelos namoricos, derreteu-se com a vinda dos sete netos. Afetuoso e caridoso, deixava o coração amolecer pela nova geração, como conta a neta Eduarda, que junto com um outro primo, foi criada na casa dos avós. E se declara: “Ele passava a imagem de fortaleza para a família e eu carrego seu sobrenome com orgulho e admiração. Ele foi minha referência paterna em tudo, nas formaturas, festas, doenças. Me ensinou o que é uma figura masculina: respeito, amor e acolhimento. É nele que eu penso e é por ele que eu tomo as minhas decisões”. Segundo ela, Jurandy sabia ser exigente como pai e caloroso e cheio de amor, mimo e colo no papel de avô. “Ele queria todos juntos, tomava a frente de tudo para proteger a família, era sábio, tinha experiência”. De espírito festeiro, gostava de reuniões e sempre garantia a cabeceira da mesa para saborear o prato predileto: o nhoque feito pelas mãos de Edna. O lugar continua guardado em homenagem à sua memória.

O futebol somava-se aos prazeres de Jurandy. Praticou o esporte até a meia-idade e não vacilou em conhecer o estádio do seu time favorito, o Palmeiras, durante uma de suas últimas viagens à capital paulista, levado pelo filho. A pesca também fazia parte dos seus hobbies, inclusive para viagens com amigos ao Mato Grosso em temporadas à beira do rio, vara e anzol à mão à espera de uma fisgada. O gosto alimentou a aquisição de um rancho em Mira Estrela, São Paulo, refúgio para onde seguia nos finais de semana e se colocava no barco à procura dos peixes. Já o mar o atraía para férias e natais com filhos e netos em Ubatuba, no litoral paulista.

Dedicado à advocacia na área tributarista, atuava na profissão e nas causas sociais, participando na administração de instituições beneficentes da cidade. Católico praticante, era também membro da Maçonaria.

Eduarda acompanhou Jurandy no hospital. Até ali a ligação com a esposa mostrou sua força: “Ele tirou a aliança e quis dar para minha avó, porque estavam o tempo todo juntos, eram muito grudados e apaixonados”. “Isso me faz muita falta, nos entendíamos só pelo olhar”, desabafa Edna. Essa cumplicidade tem nome: amor.

Jurandy nasceu em Cosmorama (SP) e faleceu em São Paulo (SP), aos 79 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Jurandy, Eduarda Andrea Pessuto Gonçalves. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Fabiana Colturato Aidar, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 7 de fevereiro de 2023.