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Lomelino Gomes Filho

1957 - 2020

Caladão, o cara mais tranquilo que existia, superfamília e torcedor fanático do Leão Azul.

Não se sabe bem como, mas Lomelino virou Laércio. Era como todos chamavam esse paraense de Cametá. O apelido-nome o acompanhou desde novinho. Ele foi da Marinha e trabalhou como agente sanitário da extinta Superintendência de Campanhas de Saúde Pública (Sucam). Servidor público da área da saúde, trabalhava para salvar vidas na região do Baixo Tocantins, no Controle de Endemias. Ironia dessas da vida: Laércio foi um profissional de ações de combate às doenças contagiosas. E, por isso mesmo, aposentou-se cedo.

Laércio era, antes de qualquer coisa, um absoluto fanático pelo Clube do Remo. O time ganhava, ele era só festa. Se perdia, se trancava em casa para evitar a gozação dos amigos. Pois não é que Laércio teve quatro filhos homens e dois deles escolheram torcer para o Paysandu Sport Club, o rival do Remo?

Mas Laércio tinha sua Selma, de quem não desgrudava nem por um segundo — e, por quem deu baixa na Marinha. Ela é remista. E, quando moleque, talvez por dó, por ele ser o único em toda a família, sua mãe torcia pelo Remo com ele. Cametá também tinha seu futebol local. Num jogo entre Guarany e Santos, quando Laércio era jovenzinho, todos os oito irmãos foram ao pequeno estádio da cidade. Houve confusão. Tiroteio. O narrador anunciou que o baleado foi o "Lomelino, filho do Lumico". A mãe dele ficou em pânico. Sorte que o tiro pegou só de raspão, na clavícula.

Laércio teve também duas netas. Ele era caladão. Só se soltava quando alguém puxava assunto ou depois de uma cervejinha, que ele tanto gostava. Sábado e domingo era lei passar o dia num clube da cidade. E todo carnaval, Laércio e Selma se dedicavam a colocar a escola "Embaixada de Samba Não Posso me Amofiná", para desfilar e ser campeã.

Na rua onde Laércio vivia, moravam seus irmãos. Ele adorava reuni-los para papear e tomar uma gelada. Quando Laércio morreu, parentes, amigos e vizinhos lotaram a rua do cemitério para se despedir — mesmo que de longe.

Lomelino nasceu em Cametá (PA) e faleceu em Abaetetuba (PA), aos 63 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela sobrinha de Lomelino, Cristiane Gomes Mendonça. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Flávia Tavares, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 26 de junho de 2020.