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Luiz da Rocha

1947 - 2020

Criou os filhos com presença, afeto e autoridade: a última palavra era dele.

De família humilde, Luiz não aprendeu a ler e só sabia escrever os números e o seu nome. Isso não o impediu de ir conquistando seu lugar ao sol e saber narrar sua história. Ele contava que o pai era homem das antigas, bastante severo, quase intolerante, e foi por isso que se rebelou e resolveu fazer a vida por conta própria, do seu jeito.

Logo que tomou coragem, saiu de casa, quando tinha uns 18 anos. Trabalhou na lavoura cultivando maçãs por um bom tempo. E foi em um vilarejo na zona rural de Água Doce, em Santa Catarina, que ele conheceu o serralheiro Pedro Waldomiro; nem imaginava que estava diante de seu futuro sogro. Pois papo vai papo vem, foi apresentado à filha de Pedro, a Neiva. Eram tempos em que o rapaz ia visitar a noiva a cavalo, trotando pelas trilhas da fazenda, à noite. Tempos que renderam boas histórias que ele depois narraria aos filhos, sobre visagens e assombrações que encontrava pelo caminho.

Luiz e Neiva se casaram bem jovens, ele com 21 anos e ela com 17. A partir daí, construíram família e venceram desafios, sempre juntos, por mais de cinquenta anos. Um dos momentos mais desafiadores que tiveram foi quando o caçula, Ricardo, foi diagnosticado com uma doença grave, a leucemia. O coração apertou. Neiva passava boa parte do tempo em trânsito, entre sua casa e o hospital, acompanhando os tratamentos do filho que eram feitos em Curitiba, a 460 km de Água Doce. Era longe. A família foi então se reorganizando e cada um a seu tempo foi mudando para Colombo, na região metropolitana da capital paranaense, para facilitar o acesso aos recursos do sistema de saúde. Valeu a pena, Ricardo se curou.

Com a mudança para a cidade, os irmãos mais velhos montaram uma lanchonete e depois de um tempo Luiz tomou a frente do negócio, transformando-o num bar que passou a gerenciar sozinho por alguns anos. Até que sofreu dois infartos e os médicos o aconselharam a não trabalhar mais, um pedido que seu espírito empreendedor não queria aceitar. Como solução, os filhos prepararam um espaço em casa, para que ele pudesse, aos domingos, vender carnes grelhadas e frango assado aos costumeiros clientes.

Seu lazer preferido era pescar na represa do Capivara com o filho mais velho, Marcos. Era apegado aos filhos e demonstrava esse afeto a seu modo, sem rodeios, sendo um pai presente, ligado ao que acontecia no dia a dia de cada um, pronto para ajudar no que precisassem. Homem muito justo, deixou o ensinamento de que é preciso batalhar para conquistar o que se quer, sempre de forma honesta, “fazendo a coisa certa”.

Como ninguém é perfeito, tinha seu jeito impositivo. Quando ouvia os filhos falando sobre algum assunto com o qual ele não concordava, logo dizia: “Você fique quieto, que eu que sei”; com a sabedoria de vida de Luiz, ninguém ousava contestar.

Luiz era uma pessoa de grande coração, um homem íntegro, batalhador, honesto. Por onde passou deixou muitos amigos e cultivou carinho. Todos sentiram não poder se despedir dele quando ficou internado pela Covid-19, ou honrar sua partida com a presença no enterro.

Deixou uma linda família com cinco filhos: Sandra, Marcos, Silvana, Maristela e Ricardo; além de sete netos e dois bisnetos.

Luiz nasceu em Tapejara (PR) e faleceu em Curitiba (PR), aos 73 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela filha de Luiz, Sandra da Rocha. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Bettina Turner, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 21 de novembro de 2021.