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Manoel Nelsongria do Nascimento Avis

1961 - 2021

Formou as filhas — advogada, dentista e farmacêutica — e seu maior orgulho era chamá-las de Doutora.

Manoel nasceu em Traquateua, interior do Pará, e mudou-se para São Paulo ainda jovem para tentar a vida na cidade grande. Ali conheceu sua futura esposa, ainda aos 15 anos, no Colégio Rui Bloy.

A filha Danielle conta como era Manoel: “Meu pai sempre foi batalhador. Ele me ensinou tudo. Desde criança lembro dele me falando o que eu devia fazer, me conduzindo. Sempre me fez estudar muito, eu e minha irmã nunca podíamos faltar à escola. Fez de tudo por nós, pela nossa educação e pelo nosso conforto”.

Ele alimentava o sonho de morar no sítio, ir embora para o interior quando se aposentasse e esse sítio chegou a ser construído, na cidade de São Miguel Arcanjo. “Ele amava ir pra lá, o sítio tem a cara dele, o cheiro dele, para onde eu olho eu me lembro dele!”.

De repente, quando tudo parecia ir muito bem, a família — que conta com vários profissionais de saúde e todos já vacinados à época — viu tudo acontecer muito rápido, com ele adoecendo e morrendo, uma semana após a comemoração de seus 60 anos no sítio que ele tanto amava.

“O coração dói, sei que preciso seguir e continuar, mas a relação que eu tinha com meu pai era muito forte, foi um elo de confiança nesta vida, parece que depois que ele partiu eu estou sozinha neste mundo”, conta Danielle que homenageia o pai num diálogo com ele:

“Até hoje eu não lembro direito o que eu sentia, só chorava e rezava! Enfim, pai, você se foi e deixou a gente aqui. Quem te conheceu sabe como você era e eu me encho de orgulho do que você foi nesta vida, meu melhor amigo e o mais bravo também!”

“Te perder foi o golpe mais duro que a vida me deu, e olha que você sabe dos golpes que já levei, mas você é tão forte que foi na frente pra esperar a gente quando a nossa hora chegar!”

E ela fala de suas reflexões sobre a morte: “É um mistério para todas as religiões, mas eu acredito que você consegue se conectar comigo através dos sonhos e eu já tive lindos sonhos com você, com altos papos, só que quando acordo não lembro. Continue me visitando, que tô morrendo de saudade”.

E Danielle fica imaginando como seriam seus diálogos com os ensinamentos do pai: “Você sempre me ensinou a não ter medo das coisas, a enfrentar e resolver, a meter as caras porque 'o não' eu já tinha! Sei que se você pudesse me falar uma última coisa, seria: 'Orelha (era assim que ele me chamava), o papai já foi, estou com Deus. Agora, filha, segura a pipa aí'”.

'Faz o que eu te ensinei: cuida da sua mãe e da sua filha. Faz o certo sempre e fica em paz, não chora. A vida continua. Não faça besteira e quando chegar a sua hora o papai estará te esperando. Pare de chorar, não se desespere, continua firme. Estarei olhando por vocês sempre, eu também sinto saudade. Te amo.'

“Sigo na esperança do reencontro. Obrigada Papa por tudo! Fui a última pessoa a te ver com vida, tomamos nosso último café da manhã no hospital e me lembro da sua carinha, nunca vou esquecer! Como eu te amo, como tive sorte de ser sua filha. Você foi o cara! Obrigada... Obrigada... Obrigada... Te amo pra sempre”, termina ela cheia de gratidão.

Manoel nasceu em Bragança (PA) e faleceu em São Caetano do Sul (SP), aos 60 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Manoel, Danielle Aparecida Mariano Aviz. Este tributo foi apurado por Lucas Cardoso e Andressa Vieira, editado por Vera Dias, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Ana Macarini em 3 de julho de 2023.