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Márcio Ricelle Araújo Carvalho

1975 - 2021

Para ele o melhor lugar do mundo era onde estivessem aqueles que amava; sua casa era o seu reino de paz.

Filho zeloso e preocupado mesmo à distância, Márcio era o segundo rebento na prole de cinco de dona Fátima e seu Bernardo. De infância simples e família grande, tanto do lado paterno quanto materno, viveu as dificuldades da época ao lado dos pais, que, com muita dedicação e labuta, conseguiram oferecer condições dignas a todos. O trabalho de seu Bernardo na construção civil e como ambulante de confecções pelo interior maranhense movimentou a família por várias cidades, até se fixarem em Teresina, capital do Piauí. Com a separação do casal passados alguns anos, Márcio continuou a morar com a mãe.

Sua vida, no entanto, deu uma guinada aos 27 anos, quando ele conheceu Adriana, em plena Copa do Mundo de 2002. Por intermédio de uma amiga em comum, a paquera começou em meio aos jogos do campeonato, quando uma turma de jovens se reunia num condomínio da vizinhança para assistir às partidas. Dali em diante os dois não mais se separaram. “Ele era meu melhor amigo e confidente. Me conhecia e me aceitava. Em 19 anos de companheirismo e parceria, crescemos juntos, era aquele que estava sempre junto, cuidando muito, amando muito, preocupado em nos oferecer o melhor. Fomos o melhor que pudemos ser um pro outro. Houve muita troca entre nós, a gente se entendia dentro das nossas diferenças. Dois geminianos que se amavam muito”, ela conta com saudades. Na intimidade, ele era o “Marcim”.

O amor dos dois foi coroado com a chegada de Ana Luísa. E Adriana relembra: “nós sempre quisemos ter filho. Depois de duas tentativas sem sucesso, alcançamos a bênção. E o Márcio como pai foi a melhor versão dele que pude presenciar e desfrutar. Desde o dia em que fizemos o teste e tivemos a confirmação da gravidez, ele desempenhou a paternidade de maneira verdadeira e exemplar. Foi minha melhor escolha. Nossa filha não poderia ter outro pai. O que existe entre eles é uma troca linda, um encontro de muito amor. Acredito que esse amor ficou e ficará gravado nela o suficiente pra mantê-la firme na caminhada. Foram sete anos de uma relação de pai e filha linda de acompanhar”. Ela lamenta a perda precoce e dolorosa do companheiro e em tom de revolta desabafa: “ele preenchia muito e faz muita falta em tudo. Parece um pesadelo sem fim essa realidade que nos foi imposta. Difícil demais continuar sem ele aqui”.

Profissional comprometido e responsável, gostava do que fazia, embora nutrisse o desejo de crescer e o sonho de empreender. Márcio era destemido e queria desbravar. Tinha a generosidade como traço forte, inclusive oferecendo apoio a causas sociais e fazendo doações. Em família, adotava o papel de conciliador e tentava apaziguar os ânimos se houvesse algum atrito. Dedicava-se a saber dos irmãos, dos sobrinhos e, sempre que podia, dava suporte financeiro nas dificuldades. Mesmo durante a pandemia, ele fez questão de ir ao interior do Maranhão visitar a mãe, as tias e tios que não via há muitos meses. Aos finais de semana, costumava garantir aquela cervejinha na companhia do pai enquanto colocavam os assuntos em dia. Também não deixou de dar apoio para a sogra, que o tratava como um filho.

Positivo e bem-humorado, Márcio era brincalhão e muito fiel aos seus poucos amigos. O temperamento caseiro o mantinha ao lado de Adriana até na hora de torcer para o Flamengo, time favorito do casal. “Márcio é eterno! Vive
em mim pra sempre!", declara-se.

Márcio nasceu em Chapadinha (MA) e faleceu em Teresina (PI), aos 46 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela companheira de Márcio, Paula Adriana de Sousa Melo. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Fabiana Colturato Aidar, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Ana Macarini em 7 de maio de 2023.