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Maria dos Anjos Freire Neves

1958 - 2021

Chamava os filhos e o marido de "meus diamantes".

Caçulinha entre dez irmãos, desde criança ela ficou conhecida como Dusanjos. Com o tempo, o apelido foi se tornando até mais adequado, pois ela foi crescendo linda como um anjo. “Sempre alguém falava da beleza dela”, explica Camila, sua filha mais velha.

Dusanjos tinha 5 anos quando a família deixou a zona rural de Alpinópolis para tentar uma vida melhor em São Paulo. Eram tempos bicudos. “Contava, que quando seu pai comprava refrigerante, naquelas garrafinhas de vidro, abria somente um furinho na tampa, batendo um prego, assim saía pouquinho e durava mais”.

Na infância, gostava de empinar pipa, jogar bolinha de gude e andar de carrinho de rolimã, sempre unida com outras duas irmãs, Léo e Carminha, que tinham idade próxima à dela. Já crescida, aprendeu a cozinhar e começou a trabalhar muito cedo para ajudar a família.

Gostava de cozinhar de tudo. Era muito conhecida pelo excelente pudim de leite condensado, que sempre fazia, a pedidos, em todos os encontros familiares.

Aos 13 anos, Dusanjos conheceu o amor da sua vida: o seu Mané. Ele era descendente de japoneses e, em 1995, foi trabalhar no Japão. Dusanjos foi no ano seguinte, com seu caçula, Eric. No Japão, ela trabalhou em diversas fábricas de componentes eletrônicos e também foi babá, pois amava crianças. Voltaram do Japão em janeiro de 2010, ano em que o marido faleceu.

No Brasil, Dusanjos trabalhou no Departamento de Pessoal do Othon Palace Hotel e da Sanyo do Brasil. “Ela sempre contava que tinha visto o Alice Cooper, com sua cobra de estimação, quando o cantor esteve hospedado no hotel”, lembra Camila. Também foi costureira e trabalhou em fábricas de doces.

Dusanjos sempre foi muito dedicada à família. “Todos diziam que ela só falava do Mané, da Camila e do Eric”, conta a filha. "Ela se orgulhava da família que construiu. Quando estava na casa de algum irmão, dizia que precisava ir embora logo pois as 'crianças' iam chegar. Mesmo quando eu e o Eric já tínhamos passado dos 30”.

Nos últimos anos, tinha um ritual diário: acordar, rezar, tomar banho e comer; limpar a casa e almoçar. À tarde, gostava de ficar assistindo a vídeos num site de compartilhamento, principalmente os de receitas e do cotidiano de "youtubers" brasileiros que moravam em outros países. “Só gostava dos vídeos longos. Uma vez, tentei instalar para ela um aplicativo de vídeos curtos, mas ela me falava que não dava tempo de aprender nenhuma receita tão rápido assim”, lembra Camila. A mãe também aproveitava a tecnologia para falar com o filho, que seguia morando no Japão. “Eles se falavam o tempo todo e ela ficava muito feliz quando, além dos áudios, eles falavam por vídeo”, conta a filha.

“Minha mãe era uma mulher bem pequenininha na estatura, mas gigante na intensidade. E inesquecível.”

Maria nasceu em Alpinópolis (MG) e faleceu em São Paulo (SP), aos 63 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Maria, Camila Neves. Este tributo foi apurado por Luciane Crippa, editado por Luciane Crippa, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 12 de janeiro de 2022.