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Maria Fortunata de Melo Rabelo

1956 - 2021

Seu empenho em estimular a leitura transformou a biblioteca da escola estadual onde trabalhava numa referência.

Maria Fortunata era uma senhora simples, uma bibliotecária aposentada, cujo nome e sobrenome poderia ser Caridade, tamanho o seu empenho — sempre com o apoio do marido — em ajudar o próximo e mudar para melhor a vida de muita gente.

Aos 18 anos ela deixou a Ilha do Marajó e seguiu para a capital, Belém, em busca de estudos e de uma vida digna para si e para a família, que acabou trazendo consigo. Entre quatro irmãos, ela foi a única que estudou. Mesmo enfrentando dificuldades financeiras, trabalhou muito para dar um lar para sua mãe. Depois, fez o mesmo para cada um dos irmãos, temendo que, no futuro, não tivessem onde morar.

Conheceu seu futuro marido ainda jovem, quando trabalhava numa butique e estudava para o vestibular. Logo se apaixonaram e viveram como verdadeiras almas gêmeas, parecendo terem sido feitos um para o outro. Nasceram no mesmo ano, viveram uma história de quarenta e dois anos de cumplicidade, entre namoro, noivado e casamento, e partiram no mesmo ano, com uma diferença de apenas doze dias.

Seus três filhos — Natacha, Rubia e Walber — representavam tudo para ela: eram seus tesouros de Deus, conforme dizia. Para eles estavam reservados o maior zelo e os melhores conselhos de uma mãe que pensava com prudência e sempre com muito amor.

Foi avó de Pedro, Mateus e Maria Vitória, e da pequena Beatriz Fortunata, que não chegou a conhecer, e que recebeu o seu nome, em sua homenagem.

Ela era devota de Nossa Senhora de Fátima e não deixava que faltasse o pagamento da contribuição dos Devotos de Nossa Senhora. Quando os Arautos do Evangelho visitaram sua casa com a imagem da Virgem, o momento foi tão impactante que seus olhos brilhavam de alegria e emoção!

Nas horas vagas, estava sempre lendo a sua Bíblia e amava cantar pelo corredor de casa a música "Pelos prados e campinas". Essa canção sempre faz a família lembrar-se dela e pensar que ela continua entoando a melodia lá no céu.

Possuía uma imensa capacidade de perdoar e de estar sempre pronta a ajudar, até mesmo às pessoas que por acaso lhe tivessem feito algum mal. A filha Natacha a descreve cheia de carinho: “Mamãe tinha um perfume único que vinha dela mesma. Suas mãos delicadas pareciam as de um anjo e seu olhar era profundo e sereno. Tinha um coração admirável que sempre perdoava o que quer que fosse”.

Enquanto bibliotecária, era apaixonada por leitura; deixava tudo bem organizado e parecia ser um dicionário pelo tanto de conhecimento que acumulava. Na escola pública onde trabalhava, frequentemente realizava eventos como luaus, peças teatrais e bibliotecas itinerantes. Tudo para estimular o gosto pela leitura e conseguiu fazer dessa biblioteca uma referência na região. Quando se aposentou, a biblioteca e a escola nunca mais foram as mesmas.

Natacha relembra duas histórias marcantes de sua vida, protagonizadas por Maria Fortunata. A primeira delas aconteceu durante sua infância: “Aos 11 anos, em uma das nossas idas à praia, entrei no mar com a minha tia. Foi a primeira vez que eu entrei no mar sem a minha mãe. Quando minha mãe percebeu que eu não estava por perto, ficou tão desesperada que começou a gritar, com medo de que eu me afogasse. Quando voltamos, ficamos sabendo do ocorrido. Detalhe: eu estava na beira do mar utilizando boia”.

A segunda ocorreu já na vida adulta: “No dia em que nasceu meu primeiro filho, mamãe ficou na porta da sala de cirurgia, pois não a deixaram entrar. Ela estava com suas mãos levantadas rezando para que Deus abençoasse a mim e ao neto. É uma recordação especial e muito emocionante!”

Fortunata dizia alegremente que havia realizado todos os seus sonhos; mas ainda queria ajeitar um pouco mais o sítio onde a família passava os finais de semana, para criar bodes e cabras.

Dentre os muitos ensinamentos que deixou, o que a família sempre se recorda — e abraça como motivação para continuar caminhando — é que ela com frequência repetia: "Vivam e sejam felizes"!

O marido de Maria Fortunata também foi uma das vítimas da Covid-19; você pode conhecer um pouco da história dele acessando a homenagem para Walderes Rabelo.

Maria nasceu em Muaná (PA) e faleceu em Belém (PA), aos 64 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Maria, Natacha Caroline de Melo Rabelo. Este tributo foi apurado por Andressa Vieira, editado por Vera Dias , revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 20 de setembro de 2022.