1952 - 2021
A alegria das comemorações familiares, era só tocar "Cheia de Manias", que a pista de dança ficava pequena para ela.
Dona Mariinha, como era carinhosamente conhecida, foi uma mulher excepcional: com sua jovialidade e uma alegria que contagiava a todos, estava sempre sorrindo e aproveitando a vida como uma dádiva.
Casou-se com Wilson, com quem conviveu por quase cinquenta anos, até sua partida. Da união entre os dois, vieram três filhos: Sandro, Bruno e Patrícia. Não media esforços para que os filhos se sentissem aconchegados, estando sempre a postos para preparar as comidas favoritas deles.
Os quatro netos, Ana Júlia, Bruna, Pedro e Enzo, eram, sem dúvida alguma, suas razões de viver. Enchia-se de orgulho em falar que era avó, dizendo a todos os conhecidos que suas netas eram as mais bonitas. Atenciosa, fazia de tudo para agradá-los. Por vezes, era uma mãe e uma avó um pouco ciumenta e implicante, mas era parte do seu modo de demonstrar cuidado com os seus amores.
A relação com as irmãs, Irani, Neném, Isabel, Iraci e Eva, já falecida, também era única e especial. Desde pequenas, as seis não se desgrudavam e caso alguém se metesse com uma delas, as outras logo partiam em sua defesa. Diariamente, faziam diversas chamadas de vídeo para conversarem entre si.
Para ela, a felicidade se fazia presente quando estava em festas e viagens na companhia de suas irmãs. A neta Bruna se recorda de duas viagens muito especiais feitas pela avó: "Minha avó sempre contava com brilho nos olhos sobre a ida ao casamento de sua irmã Neném, em Portugal. Na ocasião divertiu-se tanto que seu maior sonho era voltar novamente em terras lusitanas. Ela também adorava ir ao Mato Grosso para visitar sua irmã Irani".
Além de sua família, Dona Mariinha tinha outra grande paixão: o Cruzeiro Esporte Clube. Entoava com muito fervor os cânticos, acompanhava atentamente todos os jogos e não perdia a oportunidade de implicar com torcedores do time rival. Nos dias em que o Cruzeiro jogava, sua casa tornava-se uma festa, regada a churrascos e cervejinha bem gelada, enquanto aguardava ansiosamente o time da camisa azul-celeste entrar em campo. "Certa vez, para que minha avó realizasse o sonho de conhecer um estádio, meu pai convidou-a para assistir ao jogo do América Mineiro, no Estádio Independência. Como não perdia oportunidades, pegou sua bengala e prontamente aceitou o convite", conta Bruna.
Ao longo de sua vida, trabalhou em diversas lojas de vestuário. O jeito extremamente simpático e comunicativo, fazia com que os clientes dificilmente parassem somente para "dar uma olhadinha", sem ao menos conversar um pouco com ela. Com o tempo, optou pela dedicação exclusiva aos cuidados da família e do lar.
Quando precisava sair de casa, a família tinha duas certezas: a primeira é que estaria impecável. Vaidosa que só, não importava a ocasião, estava sempre bem arrumada, trajando inúmeros acessórios e com cabelos e unhas em gel, feitos no salão de beleza. A segunda é que certamente faria uma nova amizade pelo caminho. Com sua desenvoltura nata, em qualquer lugar que fosse, conversava com todo mundo. Se comprasse algo novo, logo chamava a neta Bruna para lhe mostrar a novidade.
Tinha fascínio por tudo que era moderno e sabia se reinventar como poucos, adaptando-se com facilidade às novas tecnologias, sua única exceção era a preferência por novelas antigas, não perdendo um capítulo sequer das reprises que passavam na televisão, no período da tarde. "Minha avó passava boa parte de seu tempo livre conectada às redes sociais, sendo a primeira pessoa a comentar minhas fotos. Volta e meia, me pedia para que mudasse a foto de seu perfil, pois tinha se cansado da outra. Passava horas à procura de novas receitas pela internet. Nós, da família, ficávamos ansiosos para experimentar os seus novos quitutes", conta Bruna.
Aliás, com suas mãos de fadas, era considerada a melhor cozinheira do mundo pela família, fazendo com que se dedicasse, cada vez mais, às iguarias favoritas de seus familiares, como moquecas, bolinhos de carne moída, sopas de pés de galinha e doces de amendoim. "Das muitas lembranças que carrego comigo, a maior parte se passa na pequena cozinha de sua casa. Eu me recordo do carinho com que ela preparava o feijão, que eu tanto gostava e que ninguém faz igual, somente para me agradar. Entre inúmeras conversas — em que eu sempre perguntava sobre a infância do meu pai, o aroma das refeições e as risadas que ecoavam por toda a casa, ficaram laços invisíveis e memórias eternas", recorda Bruna.
Devota de Nossa Senhora, fazia questão de visitar o Santuário de Aparecida, em São Paulo, em agradecimento pelas bênçãos alcançadas em sua vida. Tinha também o grande sonho de conhecer a Basílica de Nossa Senhora da Piedade, localizada na cidade mineira de Caeté.
Nas festas familiares, era a sensação: aproveitava cada celebração como se não houvesse o amanhã. Fã de "Girls just want to have fun", da cantora Cyndi Lauper, e das canções do grupo Raça Negra, era só tocar uma dessas músicas, que ela extravasava na pista de dança.
Em seus 68 anos de vida, deixou inúmeras recordações alegres, que aguçam os sentidos: o sabor de seus pratos, a gargalhada calorosa que fazia com que todos rissem juntos, as fotografias que relembram os momentos vividos, os conselhos tão preciosos que sempre levavam à decisão mais sensata. A recomendação mais valiosa, porém, veio na forma como viveu: permitiu-se ser feliz, transformando cada segundo de sua vida na mais pura diversão.
Maria nasceu em Governador Valadares (MG) e faleceu em Belo Horizonte (MG), aos 68 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pela neta de Maria, Bruna da Silva Ramos. Este tributo foi apurado por Andressa Vieira, editado por Andressa Vieira, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 12 de março de 2022.