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Maria Rolino Barbosa

1940 - 2020

Era o elo que unia e reunia toda a família com brincadeiras e histórias inesquecíveis, assim como seus bolos de milho.

Conhecida como Maria Nova, pois sua mãe também era Maria e ─ para distinguir uma da outra ─, chamavam-na assim. Os sobrinhos alternavam entre Maria Nova e Baía, de maneira sempre afetuosa.

Era solteira, nunca teve filhos; porém, criou grande parte dos irmãos e sobrinhos. Nunca foi muito afeita aos estudos, dizia que o pai fazia sua matrícula na escola, mas ela brigava com o professor e fugia do colégio. Nem por isso deixou de ser a mais sábia da família: era aquela que entendia de tudo, se metia em tudo e dava palpites em tudo. Telefonava de cinco em cinco minutos para todos, gostava muito de conversar.

Não conseguia pronunciar corretamente algumas palavras e “Débora”, por exemplo, saía “Deubra”. “Relacionamento” virava “relaciamento” e por aí vai... Era dada a brincadeiras, tudo para ela era motivo de graça; até nas situações mais inusitadas quem estava perto de Maria dava muita risada. Todos queriam que ela estivesse por perto, apenas para ouvir suas histórias e dar boas gargalhadas com seu jeito simples e despretensioso de ser e de levar a vida.

O Pai Eterno era seu guia, não perdia por nada a celebração, assim como as novelas da Rede Globo; deixava de fazer qualquer coisa só para assistir aos folhetins. O compromisso com as novelas era sagrado, ficava até tarde assistindo.

Saiu de sua pequena cidade de Poço Verde, no interior sergipano, e foi para a capital para fazer companhia aos sobrinhos que ali estudavam e trabalhavam. O tempo passou e ela foi ficando; acostumou-se de tal forma que permaneceu em Aracaju por mais de duas décadas.

Maria Nova vivia com a irmã que é viúva e com uma cuidadora. Ela administrava a casa (do seu jeito), e dava certo. Cozinhava muito bem, fazia uma comidinha simples, mas com um tempero que não será nunca esquecido por quem teve o prazer de experimentar. Fazia bolos de milho e doces para presentear os médicos e amigos. Era uma festa quando chegava aos consultórios para passar em consulta. "Os doces e bolos de milho não serão mais os mesmos", diz a sobrinha Claudia.

Dizia que odiava o aplicativo de mensagens pelo celular, pois quando chegava nas recepções dos consultórios, as pessoas não conversavam mais e ficavam só no telefone. É que ela era daquelas que amava “entrevistar” as pessoas que estavam ao seu lado.

Fez 80 anos em 2020, bem no início da pandemia. Dizia que não queria festa, somente um bolinho para tirar uma foto. Maria até se programou para comemorar com os irmãos e sobrinhos, mas todos acharam mais prudente não se reunirem para que ninguém corresse o risco de ser contaminado.

Maria não saía de casa, estava sempre deitadinha no sofá da sala, de onde comandava tudo. Mas o vírus entrou pela porta e levou Maria Nova aos dez dias de agosto, quando as novelas não mais foram assistidas, os saborosos quitutes não foram mais servidos e presenteados e o Pai Eterno a recebeu em Seus braços.

Maria nasceu em Poço Verde (SE) e faleceu em Aracaju (SE), aos 80 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela sobrinha de Maria, Claudia Barbosa Andrade. Este texto foi apurado e escrito por Lígia Franzin, revisado por Ana Macarini e moderado por Ana Macarini em 30 de março de 2021.