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Maria Roratto

1938 - 2020

Uma flor elegante que cuidava de todos e regava os sobrinhos com amor, como fazia com as rosas de seu jardim.

Maria nunca pariu, mas amava as crianças. O sobrinho Anderson diz que "a tia, sem filhos, foi mãe de outros filhos", lembrando-se do afeto que ela sempre distribuiu.

Não poupava dedicação para fazer felizes as pessoas com as quais convivia. Então, entre as coisas que mais gostava para conseguir isso, estava brincar de chef de cozinha. Nessa brincadeira fazia "delícias de dar água na boca, como um peixe delicioso", diz Anderson. Só ela tinha essa receita encantada.

Encantada com a vida era Maria. Seus olhos brilhavam com a estética das coisas todas. Talvez por isso tenha escolhido o "embelezamento" como profissão. Era maquiadora e cabeleireira das boas. Ficava sempre atenta e vibrava com as novidades da área, apresentadas pelos famosos.

Elegante, tinha a pele bem tratada e um estilo muito particular e marcante. Foi assim também que lidou com a própria partida. Declarou seu desejo de ser cremada, caso falecesse longe da cidade onde vivia. Seu desejo foi atendido, relata o sobrinho.

Anderson lamenta que a amada tia tenha passado seus últimos dias no leito de um hospital em Porto Alegre, sem contato com os familiares.

Conta o sobrinho que, no início do adoecimento, Maria se queixava de dores pelo corpo todo. E sublinha sua indignação diante de um vírus tão ameaçador: "O coronavírus é muito cruel!"

Lamenta também o fato de que, em função da potência de transmissibilidade do vírus, a família nunca mais possa ter visto sua amada Maria.

Outro pesar foi o impedimento das homenagens e nenhuma cerimônia religiosa ou despedida, tradições que a tia tanto prezava.

"Maria partiu deixando saudade imensa. A família perdeu não só uma integrante. Perdeu também a representação de um núcleo, para onde todos convergiam. A casa ficou vazia e o coração incrédulo", diz Anderson sobre o luto familiar. Os entes queridos esperam que, por meio dessa singela homenagem, possam encontrar ponte de elaboração e conforto para a dor da perda.

Suas cinzas aguardam o fim da pandemia para serem guardadas no cemitério comunitário da Barra, em sua terra natal, ao lado das irmãs.

Em pó. Assim Maria está elegantemente embalada para a eternidade. Agora deve estar botando reparo nas novas tendências estéticas lá do céu, de onde há de refletir seu brilho para acalentar o coração daqueles que na vida tanto a amaram.

Maria nasceu em Santo Ângelo (RS) e faleceu em Porto Alegre (RS), aos 81 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelo sobrinho de Maria, Anderson Roratto Ramos. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Cristina Marcondes, revisado por Paola Mariz e moderado por Rayane Urani em 27 de novembro de 2020.