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Nilton Martins

1941 - 2021

Trabalhou em farmácias por setenta anos, aliviando sofrimentos e descobrindo fórmulas mágicas para seus clientes.

Nilton começou a trabalhar ainda na infância, ajudando o pai na roça e vendendo pipocas com a irmã na saída da missa. Logo passou a atuar como praticante de farmácia, ofício que exerceu com carinho e competência. “Meu pai trabalhou atrás de um balcão de farmácia por sete décadas e sabia diagnosticar muito bem o problema de uma pessoa, tanto na área da espiritualidade quanto em relação à saúde física. Suas conversas com aqueles que o procuravam eram sempre calmas e agradáveis”, afirma a filha Georgia.

A dedicação à família não era menor. Georgia relata que Nilton foi um pai amoroso e um marido presente: “Meu pai era o amor da vida da minha mãe. Viveram juntos por quarenta e um anos e ele sempre foi um parceiro muito amigo e cuidadoso”.

Nilton também nutria um carinho especial por seu cachorro, a quem gostava de ter sempre por perto. “Nos últimos dias de vida, ficou com a memória bagunçada, mas do cachorro ele não esquecia”, conta a filha.

Além de passar o tempo na companhia do amigo de quatro patas, Nilton gostava de assistir ao futebol e vibrava com as vitórias do seu Corinthians. Divertia-se fazendo reparos no carro e viajando com a família. Tinha um apreço especial por algumas delícias, como a carne com batata que a esposa preparava. Também não resistia a um bolinho caseiro com café. “Meu pai também gostava muito da natureza. Se tivesse a oportunidade, creio que ele gostaria de ter ido morar perto do mato”, afirma a filha.

Georgia diz que, acima de tudo, o pai sentia prazer em ajudar o próximo, principalmente na área da saúde, e que geralmente o fazia através das palavras, com seu jeito tranquilizador de falar. “Ele também gostava muito de conversar com seu filho do coração, o Tiago, que era chefe dele. Outra companheira de papos era Inês, a irmã. Na pandemia, essas conversas passaram a ser possíveis apenas via telefone, mas continuavam sendo uma grande alegria para ele”.

A alegria e as brincadeiras costumavam fazer parte da rotina de Nilton, inclusive no trabalho. Georgia conta que nas drogarias antigas havia elementos separados para fazer fórmulas e que o pai, tendo muito conhecimento sobre os compostos, tinha mania de misturar componentes químicos para descobrir novos experimentos: “Em uma dessas misturas, descobriu uma fórmula e a batizou de ‘sangue do diabo’. Era um líquido vermelho que, quando espirrado na roupa, deixava a peça dessa cor, mas após alguns minutos a mancha desaparecia. Quando um vizinho, que sempre ia na farmácia para fazer traquinagens com meu pai, apareceu por lá, ele se vingou. Colocou o 'sangue do diabo' na seringa dizendo que era sangue de verdade e espirrou no vizinho. O menino saiu correndo para casa desesperado para contar à mãe o que tinha acontecido. Foi aquela confusão, a mãe do menino foi na drogaria tirar satisfação. Mas aí meu pai mostrou como funcionava aquele líquido e tudo foi esclarecido, terminando em boas risadas. Tanto que somos amigos da família até hoje”.

As recordações desta e de muitas outras histórias vividas ao lado do pai serão sempre lembradas por Georgia. Também não serão esquecidas a boa vontade e a gentileza com que Nilton procurava aliviar o sofrimento de todos que precisaram dele.

Nilton nasceu em Agudos (SP) e faleceu em São Paulo (SP), aos 80 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Nilton, Georgia Catharina Martins. Este tributo foi apurado por Andressa Vieira, editado por Renata Meffe, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 24 de junho de 2021.